ECG Insuficiência Cardíaca

Que exames complementares pedir na suspeita de amiloidose cardíaca?

Escrito por Jefferson Vieira

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Eletrocardiograma

Baixa voltagem de QRS nas derivações periféricas e progressão lenta da onda R nas derivações precordiais (padrão de pseudoinfarto) podem ocorrer em até 50% dos pacientes com amiloidose cardíaca AL, mas são menos comuns na TTR. A combinação de complexos QRS de baixa voltagem no ECG com aumento da espessura septal no ecocardiograma é altamente suspeito para a amiloidose cardíaca. Pode haver desvio extremo de eixo para direita. Outros achados incluem: BAV de 1º grau (21%), atraso inespecífico de condução intraventricular (16%), BAV de 2º ou 3º grau (3%), fibrilação atrial / flutter (20%), e taquicardia ventricular (5%). BRE e BRD também podem ocorrer. As alterações eletrocardiográficas podem se apresentar antes de qualquer alteração ecocardiográfica.

amiloidose

Exemplo de ECG em paciente com amiloidose primária envolvendo o coração. Notar a presença de área eletricamente inativa de V1 a V3 e DI e aVL, além de baixa voltagem difusa.

Ecocardiografia

Todos os pacientes com suspeita de amiloidose cardíaca devem ser submetidos a ecocardiografia. Os achados incluem espessamento ventricular concêntrico com envolvimento do ventrículo direito, disfunção biventricular com fração de ejeção normal ou levemente reduzida e espessamento valvar. Dilatação biatrial acompanhada de espessamento biventricular, valvular, e/ou septal é uma pista útil para o diagnóstico. A parede ventricular pode ser frequentemente maior que 15mm, achado incomum na miocardiopatia hipertensiva. Disfunção diastólica é a primeira anormalidade e pode ocorrer antes dos sintomas. Observa-se padrão restritivo com ausência de onda A transmitral e razão E/e’ maior que 15. A evidência de aspecto salpicado ou granular do miocárdio é bastante característico de infiltrado amilóide, embora pouco específico. O padrão de strain e strain rate do speckle tracking podem diferenciar amiloidose cardíaca de miocardiopatia hipertrófica pois há maior restrição do movimento basal comparado ao movimento apical na amiloidose.

https://youtu.be/-Us54R_4vT8?t=5s

Aumento da refringência da parede septal

https://youtu.be/ldqZ03hGfMs

Aumento da refringência das paredes do VE + espessamento das mesmas.

Mais uma vez:

espessamento de paredes no eco + ECG com baixa voltagem = pensar em doenças infiltrativas, entre elas, amiloidose. 

Ressonância Magnética Cardíaca

Já discutimos o papel da ressonância magnética cardíaca (RMC) na amiloidose cardíaca. É um método superior ao ecocardiograma na caracterização tecidual do miocárdio. O realce tardio subendocárdico difuso, embora não seja 100% especifico, é muito característico de amiloidose cardíaca e esta correlacionado com pior prognóstico. A massa ventricular é maior e o padrão de realce tardio transmural é mais extenso na amiloidose cardíaca por TTR (mutante ou senil) do que por AL, apesar do prognóstico da AL ser muito pior. A RMC também é útil na investigação de diagnósticos diferenciais, tais como miocardiopatia hipertrófica, outras doenças de depósito (hemocromatose, sarcoidose, doenças de depósito de glicogênio) e miocardiopatia hipertensiva.

Cintilografia

Radiotraçadores marcados com tecnécio-99m são avidamente captados pelo amilóide TTR e podem ser utilizados no diagnóstico diferencial da amiloidose cardíaca AL, que tem pouca ou nenhuma captação. O 123I-MIBG pode ser empregado na detecção da denervação cardíaca e da disfunção autonômica da amiloidose cardíaca.

Exames laboratoriais

O BNP está desproporcionalmente elevado na amiloidose primária devido ao efeito tóxico do amilóide AL sobre os miócitos. A troponina de alta sensibilidade é anormal em mais de 90% dos pacientes com amiloidose cardíaca primária e a combinação com BNP pode ser usada para a estratificação de risco desses indivíduos. A eletroforese de proteínas pode ser normal em metade dos pacientes com amiloidose primária, mas a imunofixação (sérica e urinária) é mais sensível e deve ser solicitada de rotina na confirmação diagnóstica. A presença de discrasia de plasmócitos com relação anormal entre as cadeias leves Kappa / Lambda é frequente em mais de 90% dos indivíduos com amiloidose primária. Hipoalbuminemia e hipercolesterolemia são comuns se existe síndrome nefrótica concomitante. Outros exames úteis para o diagnóstico de amiloidose AL são a pesquisa de proteinúria de Bence Jones, hemograma com anemia e VHS elevado. O valor desses biomarcadores na amiloidose de TTR ainda não foi determinado, mas a TTR no sangue pode ser estudada através da sequência do DNA e pesquisa de Val30Met em todos os doentes com polineuropatias cujo componente disautonômico seja evidente, mesmo na ausência de história familiar conhecida.

Biópsia (coração, rim, fígado, medula óssea e partes moles)

A biópsia endomiocárdica (BEM) ainda é considerada o método de eleição para o diagnóstico de amiloidose cardíaca. Embora o diagnóstico de envolvimento cardíaco possa ser presumivelmente atribuído a amiloidose em pacientes com quadro de amiloidose sistêmica comprovada, ECG e ecocardiograma compatíveis e biomarcadores elevados, a BEM ainda pode ser necessária para diferenciar o tipo da fibrila amilóide (AL ou TTR), pois o tratamento pode ser diferente. A BEM também pode ser considerada em indivíduos com hipertrofia ventricular que não possa ser justificada por hipertensão, doença valvar ou histórico familiar de miocardiopatia hipertrófica. A coloração vermelho-congo e a imuno-histoquímica elevam a sensibilidade do método e a microscopia sob luz polarizada mostra a birrefringência verde característica. Pode haver identificação da natureza amilóide TTR através do estudo imunocitoquímico, por anticorpos monoclonais anti-TTR. O principal risco da BEM é a perfuração ventricular.

A biópsia de rim pode ser considerada em casos de proteinúria inexplicada com piora da função renal. A análise histopatológica retal e gástrica é positiva em 80% dos casos. A biópsia hepática tem 98% de positividade na TTR, apesar do risco de hemorragia, e a biópsia de medula óssea tem 40 a 50% na AL. A histopatologia do tecido na descompressão da síndrome do túnel do carpo e a biópsia por agulha fina de subcutâneo de pele abdominal clinicamente sã também têm alta acurácia.

 

figura-de-investigacao-complementar-da-amiloidose

Referências

Falk RH, Alexander KM, Liao R, Dorbala S. AL (Light-Chain) Cardiac Amyloidosis: A Review of Diagnosis and Therapy. J Am Coll Cardiol. 2016;68(12):1323-1341. doi:10.1016/j.jacc.2016.06.053.

Gertz MA, Benson MD, Dyck PJ, et al. Diagnosis, prognosis, and therapy of transthyretin amyloidosis. J Am Coll Cardiol 2015;66:2451–66.

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Sobre o autor

Jefferson Vieira

Residência em Cardiologia pelo Instituto de Cardiologia/RS
Especialista em Cardiologia pela SBC
Especialista em Insuficiência Cardíaca e Transplante Cardíaco pelo InCor/FMUSP
Doutor em Cardiologia pela FMUSP
Médico-assistente do programa de Insuficiência Cardíaca e Transplante Cardíaco do Hospital do Coração de Messejana

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