Coronariopatia

ACC 2011 – Sub Estudo STICH Trial – Viabilidade e Sobrevida em Miocardiopatia Isquêmica

Esta publicação também está disponível em: Português

 

Dando continuidade as novidades do ACC 2011, hoje comentaremos o Sub estudo do Stich Trial ( Surgical Treatment for Ischemic Heart Failure) que avaliou a capacidade de pesquisa de viabilidade miocárdica ( Cintilogirafia miocárdica – SPECT e Ecocardiografia com Dobutamina em baixas doses) em prever incremento de sobrevida em pacientes com Doença coronária crônica e Disfunção ventricular esquerda ( aqui chamada de miocardiopatia isquêmica) submetidos a cirurgia de revascularização miocárdica ( CRM).

É importante lembrar que muitas vezes observamos melhora da função ventricular em pacientes vítimas de infarto do miocárdio   que são submetidos a revascularização e que, de acordo a estudos RETROSPECTIVO,  essa melhora na função ventricular poderia ser previstas por testes de pesquisa de viabilidade miocárdica. Nesse estudo ( STICH) , a hipótese, foi avaliada de forma PROSPECTIVA, e com ajustes a variáveis clínicas basais além da utilização do tratamento clínico otimizado atualmente vigente.

Incluiu pacientes maiores de 18 anos, com sintomas de IC CF II- IV nos últimos 3 meses , FEVE <=35% e anatomia coronariana passível de CRM. Foram excluídos pacientes com lesão de Tronco de coronária esquerda > 50%, choque cardiogênico, IAM com menos de 3 meses, e necessidade de cirurgia de correção de valva aórtica.

O desfecho primário foi Mortalidade por todas as causas e os desfechos secundários foram mortalidades por causas cardiovasculares, e  desfecho composto de morte de todas as causas e hospitalizações por causas cardiovasculares.

Dos 1212 paciente incluídos em todo STICH Trial, 601 pacientes foram submetidos a pesquisa de viabilidade miocárdica ( Cintilogirafia miocárdica – SPECT ou Ecocardiografia com Dobutamina em baixas doses) e randomizados neste sub estudo. Destes 601 pacientes, 487 revelaram viabilidade miocárdica, e 147 não tiveram viabilidade. No grupo com viabilidade ( 487), 244 foram radomizados para receber tratamento medicamentoso otimizado ( TMO) associado a CRM , enquanto 243 receberiam apenas TMO . No grupo SEM viabilidade ( 114), 54 pacientes receberiam tratamento combinado ( Clínico e cirúrgico) e 60 apenas TMO.

Após um seguimento de 5,1 anos dos 601 pacientes,  foram observados um total de 236 mortes (39%), sendo 58 dos 114  sem viabilidade  (51%)  e 178  dos 487 pacientes com viabilidade.

Os pacientes com viabilidade miocárdica morreram menos que os pacientes sem viabilidade (hazard ratio de 0.64 ,  e com IC 95% de 0.48 a 0.86; P = 0.003). No entanto,  quando os resultados foram ajustados para variáveis prognósticas de base ( FEVE, índices de volumes sistólicos e diastólicos, escores de riscos que levam em consideração idade, função renal, AVC, e outros ) a diferença de mortalidade NÃO foi significativa ( p=0,21).

A presença de viabilidade também não conferiu diferença estatística quando avaliado o desfecho secundário de morte de causas cardiovasculares após ajustes de variáveis basais ( p=0,34). Porém quanto ao desfecho composto de morte por todas as causas e internações cardiovasculares apresentou diferença estatística ( p=0,003).

Quando avaliado o tipo de tratamento ( TMO ou combinado) em relação a condição de viabilidade miocárdica, também não houve diferenças estatísticas discriminatórias com relação a Mortalidade por todas as causas ( p=0,53); Mortalidade cardiovascular ( p=0,70);  ou desfecho combinado de mortalidade de todas as causas e internações cardiovasculares ( p=0,39).

A mensagem que devemos guardar neste estudo é que não devemos utilizar exclusivamente a viabilidade miocárdica para indicação cirúrgicas ( nem sempre que tem viabilidade vai melhorar) e principalmente, não devemos excluir aqueles pacientes em que não há viabilidade miocárdica definida pelos parâmetros de cintilografia ou eco com dobutamina de um possível benefício cirúrgico. Portanto,  devemos abandonar o conceito de viabilidade com “TUDO ou NADA”, em ter ou não viabilidade ser um critério de indicação ou não de CRM, e pensar em um conceito de espectral em que devemos analisar um continum com quantidade e extensão da viabilidade.

 

REFERÊNCIAS:

1) Bonow RO, Maurer G, Lee KL, et al. Myocardial viability and survival in ischemic left ventricular dysfunction. N Engl J Med 2011; DOI: 10156.NEJMoa1100358.

2) http://www.theheart.org

 

 

 

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Sobre o autor

André Lima

9 comentários

  • Amigos, o Trial foi interessante, porém desde nossa época da UCO-InCor havia algumas críticas à metodologia do trabalho.
    O principal, pra mim, é que a viabilidade foi avaliada por métodos não “gold standart”- Ressância cardíaca com Realce Tardio ( para a maioria) ou mesmo o PET-FDG.
    Abs
    Guilherme Azevedo

    • Guilherme,
      o PET realmente é tido como o padrão-ouro para viabilidade principalmente pela sua sensibilidade. Já vi mais de uma caso em que a cintilo ou a RNM falavam que não havia viabilidade mas o PET mostrava que ela estava lá. Mas o grande negócio é que no STICH o critério de viabilidade pelo eco,por exemplo, é que tivesse pelo menos 5 segmentos (dos 17) que em repouso contraíssem mal e que esta contratilidade melhorasse com doses baixas de dobuta. ou seja, era um critério muito específico para dizer que havia sim viabilidade. Pode não ser muito sensível, mas muito específico era. E mesmo com este critério específico não houve grandes melhoras em predizer resposta a CABG.
      Lembrar semrpre que a parte do estudo de viabilidade não foi randomizada. Era para ser, mas como eles viram que ia demorar muito para randomizar todo mundo se fosse critério de inclusão eles terminaram deixando opcional. Assim sendo, existem vários vieses na seleção dos pctes que fizeram os teses de viabilidade quando comparados à população geral do estudo.
      Acho que a viabilidade não foi para o espaço não mas que levou um balde de água fria isso sim. Todos os estudos que haviam de viabilidade previamente era muito pequenos ou retrospectivos ou metanálises. Este foi o primeiro trial prospectivo e grande.

    • Excelente colocação Guilherme. Outra informação adicional é que inicialmente o Trial avaliaria apenas cintilografia, mas com o decorrer do estudo que contava com´vários centros, isto seria inviável pela indisponibilidade global do exame e foi autorizado a inclusão da análise da ecocardiografia com dobutamina. Existem pacientes neste trial que foram submetidos a Ressonância Magnética e os dados ainda serão divulgados no fututo após análise.
      Acho importante lembrar que o teste de pesquisa de viabilidade não foi útil para indicar ou não sucesso do procedimento de revascularização, mas se revelou como mais um critério prognóstico indicando que os pacientes sem viabilidade tinham uma mortalidade maior.
      Como Lapa falou, creio que métodos como o PET ainda poderão nos ajudar na decisão, mas também carecem de estudos robustos.
      Vamos aguardar a análise com os resultados da Ressonância.

  • Boa e velha discussão na UCO-Incor, pesquisar ou não viabilidade, não indicar ou indicar uma cirurgia usando o resultado do PET ou RM….. Vi de tudo, pctes teoricamente sem viabilidade melhorarem sintomas e função e pctes cheio de viabilidade no PET evoluirem mal, pois é acho que o bom senso do médico ainda deve ser o mais importante nessa decisão.

  • Caros amigos, este trabalho é muito interessante mas vem com falhas que ocorreram em outros trabalhos. O primeiro ponto é questionar como se defini viabilidade em cada método? Como foi a validação deste método. Este é um ponto crucial porque todos os métodos tem definições diferentes. Quando se fala em músculo viavel queremos dizer a parede, um pedaço dela ou o coração como um todo? Outro ponto que infelizmente ninguem abordou em trabalhos ainda é a se haveria diferença na evolução do paciente realizar um indicação funcional na presença de viabilidade. Como método gold standart discordo que haja um método. O que mostrou melhor correlação com eventos futuros (MELHORA FUNCIONAL E REDUÇÃO DE MORTALIDADE) foi o PETSCAN – mas estamos comparando métodos que avaliaram definições diferentes! Quando se comparou RNM com PETSCAN em pacts pre Tx – a analise anatomopatologica do orgão após TX a RNM teve sensibilidade e especificidade maior que o PET pela melhor definição espacial de areas de necrose. Quanto a pacientes no INCOR que melhoraram após tratamento cirurgico sem viabilidade – desconheço – pelo menos nos anos de 2009 e 2010 não houve nenhum paciente que apresentou melhora funcional ou de contratilidade da parede sem viabilidade apos procedimento. Na verdade nestes dois anos com pesquisa de viabilidade só 9 pacientes foram para cirurgia nestas condições. Acho que não há resposta se poderemos modificar as indicações de reperfusão para pacientes com mioc isquêmica com o que temos em mão hoje – Revascularização anatômica ou funcional para pacientes com disfunção grave?

  • Edu,
    na verdade o “padrão-ouro” para viabilidade é operar e ver se melhora com a cirurgia.É a mesma coisa do padrão-ouro para saber se o pcte responde a volume ou não – é fazer volume e ver se o débito cardíaco do pcte melhora ou não. O que se tenta fazer é usar algum método que faça a predição da resposta de forma a selecionar melhor o pcte que terá benefício ou não com a cirurgia. O que foi mostrado é que os 2 métodos usados não tiveram esta capacidade. Em breve vai sair a subanálise dos pctes que fizeram RNM – vamos ver se será diferente. Como disse antes, acho que este estudo não enterrou a viabilidade de forma alguma mas mostrou que da forma empregada no trial ela realmente não serviu de muita coisa.
    Reitero mais uma vez que a análise de viabilidade do estudo não foi randomizada. Pediu-se estudo de viabilidade para quem o médico assistente achou que tinha que pedir. Na análise primária do estudo vu-se que quem tinha viabilidade morria menos do que quem não tinha mas mesmo isso foi por água abaixo após se corrigir esta análise por outras variáveis. Como assim??? Quando o estudo é randomizado as características basais dos pctes sem praticamente iguais (sexo, idade, comorbidades, etc) exceto pela variável estudada. Assim sendo, se tivesse sido randomizado o estudo da viabiliadade compararia pctes iguais exceto pelo fato de um grupo ter viabilidade e o outro não ter. Qualquer diferença entre os 2 grupos seria, a priori, fruto da existência ou não de viabilidade. Contudo, como isto não aconteceu, os pesquisadores têm que ajustar os resultados para tentar eliminar os fatores confundidores (comorbidades, etc). Quando isto foi feito até o fator prognóstico da viabilidade se perdeu.

    • Lapa, antes de mais nada, parabéns a todos vocês pelo site!
      Só para esclarecer melhor sobre o que você disse sobre o efeito da randomização… Não acho que isso diminui a qualidade do trabalho e dos resultados. Até porque, na verdade, é impossível randomizar pacientes com as mesmas características, exceto pelo fato de terem ou não viabilidade. A randomização é feita pelo investigador para garantir condições iguais, em ambos os grupos, para uma intervenção, um tratamento, etc…, e não para uma característica do paciente, como por exemplo viabilidade. Assim, não daria para o investigador sortear: você vai ter viabilidade, você não vai ter, e sim, se ele vai operar ou não, como aconteceu. E no que tange aos tratamentos, os grupos eram bem similares, como mostra a tabela:
      http://www.nejm.org/action/showImage?doi=10.1056%2FNEJMoa1100358&iid=t01

      Este estudo é, na verdade, uma coorte de um ensaio clínico, e não um ensaio clínico por si. E deve ser visto com todas as restrições, como você bem ressaltou. Devemos lembrar, no entanto, que a maior parte do que sabemos hoje de prevenção primária em DCV vem da coorte Framingham. Também acho que este estudo não enterra os estudos de viabilidade, mas a maneira como utilizaremos isto será bem diferente.
      Abraços a todos!

  • Humberto,
    obrigado pelos comentários.
    Concordo que este estudo não enterra o conceito de viabilidade. Sigo a opinião do galego – é um dado a mais para você decidir. Mesmo que a viabilidade seja ausente, se o pcte estiver com sintomas importantes (principalmente angina) e não tiver um risco cirúrgico proibitivo, pode ser candidato sim a RM. A ausência de viabilidade não descarta o procedimento.

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