Coronariopatia Hemodinâmica Nefrologia

Acesso radial reduz a incidência de insuficiência renal aguda?

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Em pacientes com Síndrome Coronariana Aguda (SCA) com ou sem elevação do segmento ST, a intervenção coronária percutânea (ICP) para reestabelecer o fluxo coronariano na artéria relacionada ao infarto reduz a incidência de eventos clínicos. Nos últimos anos, sucessivos estudos (Rival, Rifle, Matrix) têm demonstrado que o sítio de acesso vascular radial se correlaciona com diminuição na taxa de eventos adversos quando comparado ao acesso femoral neste contexto. A análise destes estudos demonstra ainda que a redução da incidência de eventos duros incluindo mortalidade pelo acesso radial se deve, principalmente, à diminuição de complicações hemorrágicas maiores.

Assim sendo, será que ao reduzir sangramento grave, com instabilidade hemodinâmica e necessidade de hemotransfusão, o acesso radial reduz consequentemente a incidência de infuciência renal aguda (IRA)? Esta é a questão que se propõe a responder esta subanálise do estudo Matrix publicada recentemente no JACC.

O Matrix trial foi um estudo randomizado, multicêntrico, internacional, que incluiu 8.404 pacientes com SCA com ou sem supra ST submetidos a cateterismo cardíaco de urgência, com ou sem a necessidade de angioplatia coronária, e randomizou para dois grupos de acordo com o acesso vascular utilizado (radial x femoral). O resultado geral do estudo mostrou uma redução de 17% em net adverse clinical events (morte, IAM e sangramento) e 33% em sangramento maior. Além disso, o Matrix demonstrou uma redução significativa da mortalidade geral no grupo do acesso radial (RR: 0,72; 95% IC: 0,53 a 0,99; p:0,045).

O estudo que descrevemos nest post é uma análise pré-especificada do protocolo original do Matrix que analisou a incidência de IRA pós-procedimento de acordo com o acesso vascular (radial x femoral). O desfecho primário foi a ocorrência de aumento absoluto da Creatinina sérica > 0,5 mg/dl e/ou o aumento relativo de 25% em relação ao valor basal.

A incidência de IRA foi de 634 pacientes (15,4%) com acesso radial e 712 pacientes (17,4%) com acesso femoral (OR: 0,87; 95% IC: 0,77 a 0,98; p: 0,0181). O resultado foi consistente mesmo quando analisados cada critério para IRA individualmente. Necessidade de hemodiálise ocorreu em 6 pacientes (0,15%) com acesso radial e 14 pacientes (0,34%) com acesso femoral (p: 0,0814). A subanálise por grupos sugere um benefício ainda maior do acesso radial para os pacientes de alto risco para IRA.

Ao se considerar a validação externa deste estudo e a extrapolação destes resultados para a prática diária, é preciso atentar para alguns fatos importantes. Em primeiro lugar, o estudo Matrix foi conduzido em centros com grande expertise em intervenções por acesso radial. Fato demonstrado pela ausência de diferença do tempo de procedimento, volume de contraste e dose de radiação entre os grupos. Isto não necessariamente é uma realidade em todos os serviços de hemodinâmica ao redor do mundo. Segundo, o estudo Matrix envolveu paciente com síndromes agudas sendo a maioria dos pacientes submetidos a cate + intervenção. Isto não nos permite concluir que o acesso radial reduz a incidência de IRA, por exemplo, em um paciente estável encaminhado para coronariografia eletiva.

Dito isso, concluiremos este post com algumas opiniões pessoais:

  • O acesso radial consistentemente reduz complicações hemorrágicas graves em todos os trabalhos randomizados. Ao reduzir este desfecho, é extremamente plausível a hipótese de que também reduzirá a incidência de IRA pós-procedimento;
  • Este estudo modificará as diretrizes e a nossa prática diária? Depende. No que diz respeito à escolha pelo acesso radial em síndromes instáveis, esta já é a recomendação atual. Com relação à indicação do acesso radial especificamente como estratégia para prevenção de nefropatia em pacientes com alto risco para IRA, este estudo posiciona o acesso radial como mais uma ferramenta que poderá ajudar a diminuir a incidência desta complicação, mas não como uma indicação formal;
  • é fundamental levar em consideração na tomada de decisão a expertise do operador/equipe com a via radial. Se em um determinado centro, os operadores tem grande experiência e bons resultados com o acesso femoral, e pouca expertise com a via radial, a primeira (femoral) certamente trará mais benefício para os pacientes neste centro específico.

Referência bibliográfica:

  • Andò G, Cortese B, Valgimigli M et al. Acute Kidney Injury After Radial or Femoral Access for Invasive Acute Coronary Syndrome Management. DOI: 1016/j.jacc.2017.02.070.
  • Jolly SS, Alazzoni A et al. Should the AKI-MATRIX Trial Change Our Practice? DOI: 10.1016/j.jacc.2017.02.071.

 

 

 

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Sobre o autor

Eduardo Pessoa de Melo

Residência em Cardiologia pelo InCor/FMUSP
Título de Especialista em Cardiologia pela SBC
Especialista em Cardiologia Intervencionista pelo InCor/FMUSP
Sócio Titular da Sociedade Brasileira de Cardiologia Intervencionista
Cardiologista Intervencionista do PROCAPE/UPE
Cardiologista Intervencionista da Rede D'Or São Luiz:
- Hospital Esperança
- Hospital Esperança Olinda
- Hospital São Marcos

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