Hipertensão arterial sistêmica Prevenção

É hora de abandonar a medida de pressão no consultório ?

Escrito por Thiago Midlej

Esta publicação também está disponível em: Português

Aproximadamente um século depois de ausculta arterial por Korotkoff e da invenção do esfigmomanômetro por Riva-Rocci o diagnóstico, estratificação e tratamento da hipertensão arterial sistêmica (HAS) ainda se baseiam nesses princípios. Desde então os valores de pressão arterial (PA) para classificar um paciente como hipertenso ou não, se modificaram ao longo do tempo e ainda são motivo de controvérsia em diversos estudos e diferentes diretrizes.
A PA é altamente variável por fatores metabólicos, físicos e posturais e, portanto, é fundamental a padronização das suas medidas. A 7ª diretriz brasileira de hipertensão explica os procedimentos adequados para aferir a PA, mas esse rigor é pouco usado na prática clínica e, como consequência, essas medidas são mais elevadas do que se tivessem sido respeitadas as condições e orientações para medir a PA.
A MAPA e MRPA evidenciam que as medidas de PA podem variar de acordo com o método utilizado. Assim, temos a HAS do avental branco e a HAS mascarada onde a PA do consultório diverge da PA medidas por esses métodos. Alguns estudos evidenciaram que a média de PA da MAPA é um forte preditor de lesão de órgão alvo, eventos cardiovasculares adversos, e mortalidade quando comparados com a medida de PA de consultório.
A HAS mascarada tem recebido menos atenção do que a HAS do avental branco e frequentemente permanece não diagnosticada e, consequentemente, não tratada. Alguns estudos apontam uma prevalência de 25% de HAS mascarada, principalmente em jovens e com medidas de PA no consultório limítrofes. A HAS mascarada está associada com maior risco cardiovascular do que a HAS do avental branco e risco tão elevado quanto pacientes portadores de hipertensão confirmada.
Um estudo publicado no Circulation avaliou 1010 indivíduos com idade ≥21 anos, sem doença cardiovascular, com PA <160/105 mmHg. A PA de consultório foi avaliada 3 vezes em cada visita, em 3 semanas e todos foram submetidos a avaliação com MAPA. A média de PA do MAPA durante o dia foi 7/2 mmHg mais elevada do que a PA de consultório. Essa diferença era mais evidente em jovens e menos evidente em indivíduos com IMC elevado. Baseado nesse estudo, apenas 5,3% do pacientes receberem o diagnóstico de HAS baseado na medida de consultório. Pela MAPA, entretanto, de acordo com a média de PA diurno, 19,2% eram hipertensos.
Assim questiona-se se a média de PA de consultório ainda deve ser considerada como suficiente para o diagnostico e controle da HAS. O Instituto Nacional de Saúde do Reino Unido publicou uma diretriz recente em que recomenda a MAPA para confirmar o diagnostico de HAS em pacientes que apresentaram PA elevada no consultório. Se a MAPA não puder ser realizada, medida domiciliares de PA pode ser uma alternativa. O fato da HAS mascarada ser mais comum em homens jovens, magros e com PA de consultório limítrofes (130-139/85-89 mmHg) fornece a base para o uso da MAPA e MRPA para ajudar no screening da estratificação.

Opinião do autor: a nova diretriz brasileira tem critérios claros para a solicitação de MAPA e MRPA. Esse editorial, polêmico desde o título, chama atenção para algumas evidências que colocam em discussão a eficácia da medida de PA nos consultórios. O fato é que, apesar da clareza nas orientações, a aferição da PA, na prática clínica, não é realizada de forma adequada, respeitando-se todos as orientações e passos. Os métodos complementares auxiliam bastante no diagnóstico, mas as medidas no consultório, bem realizadas, ainda são fundamentais, e talvez serão ainda por mais tempo que pudessem imaginar Korotkoff e Riva-Rocci.

Referências:
1- Bryan Williams, MD, Time to Abandon Clinic Blood Pressure for Diagnosis of Hypertension?, Editorial Circulation, 2016, 134: 1808-1811
2- Malachias MVB, Souza WKSB, Plavnik FL, Rodrigues CIS, Brandão AA, Neves MFT, et al. 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial. Arq Bras Cardiol 2016; 107(3Supl.3):1-83

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Sobre o autor

Thiago Midlej

Especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia​ e pelo Instituto do Coração da Faculdade de Medicina de São Paulo - I​NCOR​​.
Pós graduando da Unidade de Hipertensão do​​ I​NCOR​
Médico plantonista da Unidade Clínica de Emergência do INCOR
​​Cardiologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz

1 comentário

  • Olá Thiago. Excelente texto. Ainda acho que na medida do possível deve se associar uma combinação dos métodos (PA no consultório medida adequadamente + MAPA/MRPA). De resto individualizar os casos. Valeu!

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