Hemodinâmica Miscelânia Valvopatias

É seguro fazer um cateterismo em paciente com Endocardite Infecciosa?

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Esta é uma dúvida que frequentemente nos aparece na prática clínica. Qual o real risco de submeter um paciente com endocardite a uma coronariografia? A manipulação do cateter durante o procedimento aumenta o risco de embolização da vegetação? O risco da manipulação é maior para a válvula aórtica ou para mitral e tricúspide?

Um artigo de revisão publicado por Kung et al. em 2011 nos ajuda a esclarecer um pouco melhor estas dúvidas. A evidência da literatura para responder a estes questionamentos não é muito extensa e se baseia, na maior parte, em estudos antigos (década de 80) e com pequeno número de pacientes. No entanto, destes podemos extrair algumas informações úteis.

Primeiro, de maneira geral, a maioria dos autores conclui que é seguro fazer uma coronariografia em um paciente portador de endocardite infecciosa. Na maior parte dos trabalhos, o procedimento de cineangiocoronariografia não aumentou o risco de embolização, não piorou o quadro clínico do paciente, não alterou os parâmetros ecocardiográficos e não houve diferença de eventos com relação ao tipo de válvula acometida (aórtica, mitral, tricúspide ou prótese).

Segundo, talvez uma das mais emblemáticas publicações sobre o tema seja um relato de Shamsham et al, no qual os autores descrevem um caso de embolização fatal para o tronco da coronária esquerda em um paciente portador de uma grande vegetação móvel na válvula aórtica, após a realização de uma coronariografia. Embolização é de fato a complicação mais temida e que, mesmo com um nível de evidência pequeno, norteia as orientações das principais diretrizes.

Terceiro, o que os guidelines de valvopatias da ESC 2012 sugerem é que: pacientes que serão encaminhados para cirurgia de troca valvar (lato sensu, não só por endocardite), devem ser submetidos a um cateterismo para coronariografia quando apresentarem história prévia de DAC; suspeita clínica de isquemia miocárdica; disfunção ventricular esquerda; homens com > 40 anos e mulheres pós-menopausa; e pacientes com ≥ 1 fator de risco cardiovascular. E os autores deste artigo de revisão concluem que duas exceções devem ser colocadas no contexto da endocardite: pacientes com grandes vegetações em válvula aórtica, devido ao risco de embolização durante a manipulação, e em cirurgias de emergência.

Opinião pessoal:

  • um aspecto pouco comentado na literatura é sobre o tipo de procedimento realizado. Talvez tenha uma importância didática para este assunto separar o cateterismo cardíaco diagnóstico em dois grupos: coronariografia versus coronariografia + ventriculografía esquerda. No nosso entendimento, tratando-se de um paciente portador de endocardite, o cateterismo será indicado em duas situações: avaliação pré-operatória para cirurgia de troca valvar ou em uma eventual síndrome coronariana aguda. Em ambas, a informação mais importante para o quadro será a anatomia coronariana. Para a avaliação da função ventricular e do refluxo da válvula mitral existem diversos métodos não invasivos que podem substituir a ventriculografia. Portanto, quando indicado o cateterismo, e houver o diagnóstico de vegetação em válvulas esquerdas (mitral ou aórtica), nos parece mais prudente para a maioria dos casos a realização apenas da coronariografia.
  • Para qualquer tema em medicina, quando o nível de evidência da literatura não é muito sólido, a opinião e o bom senso do especialista podem (e devem) ser considerados para a tomada de decisão.

Referência bibliográfica:

  • Kung VWS, Jarral OA, McCormack DJ et al. Is it safe to perform coronary angiography during acute endocarditis? Interactive CardioVascular and Thoracic Surgery 13 (2011) 158-167.
  • Shamsham F, Safi AM, Alam M et al. Fatal left main coronary artery embolism from aortic valve endo­carditis following cardiac catheterization. Catheter Cardiovasc Interv 2000;50:64–77.
  • Vanhanian A, Alffieri O et al. ESC Guidelines on the management of valvular heart disease (version 2012). European Heart Journal (2012) 33, 2451–2496 doi:10.1093/eurheartj/ehs109.

 

 

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Sobre o autor

Eduardo Pessoa de Melo

Residência em Cardiologia pelo InCor/FMUSP
Título de Especialista em Cardiologia pela SBC
Especialista em Cardiologia Intervencionista pelo InCor/FMUSP
Sócio Titular da Sociedade Brasileira de Cardiologia Intervencionista
Cardiologista Intervencionista do PROCAPE/UPE
Cardiologista Intervencionista da Rede D'Or São Luiz:
- Hospital Esperança
- Hospital Esperança Olinda
- Hospital São Marcos

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