Emergências Insuficiência Cardíaca

É seguro usar Entresto no paciente com Insuficiência Cardíaca descompensada?

Escrito por Jefferson Vieira

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O tratamento farmacológico da insuficiência cardíaca agudamente descompensada (ICAD) permanece praticamente inalterado nos últimos 45 anos, e consiste basicamente de diureticoterapia endovenosa e suporte hemodinâmico com vasodilatadores e inotrópicos. O estudo PARADIGM-HF demonstrou o benefício adicional da introdução do Sacubitril/Valsartana (SAC/VAL) em substituição ao Enalapril no tratamento de pacientes com ICFER, mas o desenho do estudo excluiu doentes hospitalizados. Isso porque o SAC/VAL apresenta um potente efeito vasodilatador e sempre existiu preocupação em doentes com ICAD, que geralmente encontram-se hipotensos e sob infusão de diuréticos e outros vasodilatadores.

Recentemente foi apresentado no AHA, e publicado simultaneamente no NEJM, o estudo PIONEER-HF que envolveu 881 pacientes hospitalizados por ICAD (FE ≤ 40%) que foram randomizados aleatoriamente para terapia com SAC/VAL ou Enalapril após um breve período de estabilização hemodinâmica.

  • Estabilidade hemodinâmica foi definida como PAS ≥ 100mmHg nas últimas 6 horas, ausência de vasodilatador EV ou de ajuste na dose do diurético EV nas últimas 6 horas e ausência de inotrópico EV nas últimas 24 horas. Esses critérios de estabilidade foram alcançados, em média, dentro de 50 horas após a admissão;
  • A dose inicial do grupo SAC/VAL foi de 24/26mg 2x/dia e a dose alvo foi de 97/103mg 2x/dia;
  • A dose inicial do grupo Enalapril foi de 2,5mg 2x/dia e a dose alvo foi de 10mg 2x/dia (* os autores optaram pela mesma dose alvo de Enalapril que gerou muita discussão no PARADIGM-HF);
  • O desfecho primário foi a mudança na concentração basal de NT-proBNP ao longo da 4ª e 8ª semanas de terapia. Vale lembrar que o BNP não serve como biomarcador de IC em pacientes com SAC/VAL. Os desfechos de segurança foram piora da função renal, hipercalemia, hipotensão sintomática e angioedema.

A redução média na concentração do NT-proBNP foi significativamente maior no grupo SAC/VAL (variação percentual de -46,7% contra -25,3% no grupo Enalapril), evidente já na 1ª semana de terapia. O SAC/VAL também foi superior ao Enalapril no desfecho clínico secundário composto de morte, readmissão por IC, implante de dispositivo de assistência ventricular esquerda ou listagem em fila de transplante. Os desfechos de segurança não foram significativamente diferentes entre os dois grupos. Na verdade, o estudo até mostrou numericamente menos casos de angioedema com SAC/VAL, confirmado em um paciente branco, quando comparado com seis casos em pacientes afrodescendentes que recebiam Enalapril.

Na prática:

  • o PIONEER-HF estendeu as descobertas do PARADIGM-HF para o cenário clínico da hospitalização por ICAD, embora tenha usado o NT-proBNP como desefecho substituto. Além disso, o PIONNER-HF parece ter respondido a dúvida sobre o uso do SAC/VAL como primeira opção de bloqueio do sistema renina-angiotensina-aldosterona em doentes virgens de tratamento. Isso porque o PARADIGM-HF fez uso de uma fase de run-in e todos os doentes que entraram no estudo receberam obrigatoriamente o Enalapril antes do SAC/VAL. Por conta disso, as diretrizes internacionais entraram em conflito sobre qual o melhor momento para iniciar o SAC/VAL (se poderia iniciar como primeira opção ou somente depois de confirmar a refratariedade ao iECA?). No PIONEER-HF em torno de 35% dos pacientes foram admitidos sem diagnóstico prévio de IC (“IC de novo”) e, portanto, não recebiam nenhuma medicação de modulação neuro-hormonal no momento da randomização o que não influenciou os resultados do estudo.
  • Vale ressaltar que apesar de todos os cuidados com a randomização, aproximadamente 20% dos doentes de cada grupo interromperam o tratamento antes da 8ª semana, na maioria das vezes devido a algum evento adverso. Essa alta taxa de dropout sugere que, nesta população, o início de qualquer modulador neuro-hormonal deva ser realizado com muita cautela.
  • Estudos clássicos com betabloqueadores nos mostraram que se um paciente não começar a receber um determinado tratamento durante a internação, mesmo que no momento da alta esteja com subdose, a chance de ele começar a receber o tratamento a nível ambulatorial cai para 20%. Assim, provavelmente a maior mensagem do PIONEER-HF seja de que é seguro começar o tratamento da IC ainda no hospital, aumentando as chances de o doente receber o tratamento adequado no longo-prazo.

Velazquez EJ, Morrow DA, DeVore AD, et al. Angiotensin-neprilysin inhibition in acute decompensated heart failure. N Engl J Med. 2018;Epub ahead of print.

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Sobre o autor

Jefferson Vieira

Residência em Cardiologia pelo Instituto de Cardiologia/RS
Especialista em Cardiologia pela SBC
Especialista em Insuficiência Cardíaca e Transplante Cardíaco pelo InCor/FMUSP
Doutor em Cardiologia pela FMUSP
Médico-assistente do programa de Insuficiência Cardíaca e Transplante Cardíaco do Hospital do Coração de Messejana

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