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Escore de Cálcio da Valva Aórtica. Isso existe?

Escrito por Alexandre Volney

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A estenose aórtica (EAo) é uma doença degenerativa da valva aórtica que acomete preferencialmente indivíduos idosos (3-6% das pessoas acima de 65 anos) e se caracteriza por espessamento  e enrijecimento dos folhetos determinando redução do orifício valvar e consequente limitação do fluxo sanguíneo ejetado.

O tratamento como sabemos é invasivo (cirúrgico ou percutâneo) através da troca valvar. O diagnóstico é clinico e o ecocardiograma é o método auxiliar de escolha na determinação da gravidade da estenose. Entretanto, em até 40% dos pacientes pode persistir dúvida quanto a gravidade da doença.

Um dos mecanismos fisiopatológicos conceituais se baseia na lesão do endotélio valvar facilitando infiltração de células inflamatórias, deposição lipídica e calcificação (vide pacientes com valva bicúspide).  Essa semelhança com o processo aterosclerótico explica a associação da EAo com fatores de risco cardiovascular. Assim a progressão da calcificação valvar está associada com a evolução e gravidade da doença.

Ok, mas onde entra a tomografia cardíaca?

A tomografia é um método excelente para identificação de cálcio (lembra do escore de cálcio?).  Então diversos estudos observacionais recentes correlacionaram a quantificação do escore de cálcio valvar aórtico (ECVAo) semelhante como fazemos para a coronária com a gravidade da estenose aórtica, demonstrando correlação positiva com ótima acurácia.

Bom, mas como funciona isso?

É feito uma aquisição tomográfica sincronizada com o eletrocardiograma (exatamente igual quando queremos avaliar o escore de cálcio coronariano), sem uso de contraste iodado e com baixa dose de radiação. É feita manualmente a identificação dos focos de calcificação da valva usando para quantificação o método clássico de Agatston (não lembra? Veja aqui). A somatória das lesões identificadas gera o valor do escore valvar.

Escore de Cálcio Valvar medido pela tomografia cardíaca em paciente com estenose valvar aórtica importante. Em amarelo as calcificações da valva aórtica. No canto inferior direito a quantificação total das lesões com ECVAo de 6215 Agatston.

Como e onde posso usar esse dado?

Primeiro precisamos saber que existem thresholds determinados pela análise dos diversos estudos  e que apresentam excelente correlação com EAo importante: 1200 Agatston para mulheres e 2000 Agatston para homens. Esses valores apresenta sensibilidade e especificidade de cerca de 85-90%e 80-84%, respectivamente.

Nota do editor (Eduardo Lapa): Para quem for fazer prova de título em cardiologia, atentar que a diretriz brasileira de 2017 coloca o ponte de corte de 1650 agatston para homens. 

Dica:

  • O cenário clínico mais comum para se utilizar o ECVAo seria naquele paciente com resultados conflitantes no ecocardiograma, por exemplo pacientes com EAo baixo fluxo/baixo gradiente.

Além disso, o ECV foi um excelente preditor de evolução clínica. Dessa forma, um cenário potencial seria na avaliação de pacientes com estenose moderada. Um ECV próximo aos thresoulds seria um marcador de evolução para estenose grave orientando o clínico quanto a um segmento mais próximo do paciente.

Mas existe alguma diretriz internacional que utiliza o ECV?

Sim! A diretriz europeia de valvopatia desde 2017 inclui a análise do ECVAo no algoritmo de investigação da estenose aórtica baixo fluxo/baixo gradiente.

Nesses casos eles recomendam avaliação do ECVAo em pacientes com fração de ejeção preservada ou sem reserva contrátil no ecocardiograma de estresse farmacológico. A diretriz brasileira do mesmo ano também usa as mesmas indicações.

Exemplo prático: mulher idosa com ecocardiograma demonstrando AVA < 1cm2 e baixo fluxo (SVi < 35ml/m2) com FE preservada e ECVAo  700 Agatston baixa probabilidade de estenose aórtica importante devendo seguir em acompanhamento clinico.

Outro exemplo: homem com com ecocardiograma demonstrando AVA < 1cm2 e baixo fluxo (SVi < 35ml/m2) com FE reduzida submetido a estresse farmacológico sem melhora contrátil e EVAo de 3500 Agatston tem elevada probabilidade de estenose aórtica importante devendo ser considerado para tratamento invasivo.

Exemplo do dia a dia (crédito do nosso colega Dr Cristiano Guedes)

Paciente idoso avaliada por heart team com suspeita de estenose aórtica com gradiente médio de 8mmHg, disfunção ventricular e alto risco cirúrgico. CATE com lesões de tronco e coronária direita. Contra-indicado ecocardiograma com estresse farmacológico.  ECVAo 600 Agatston.  Optado por tratamento percutâneo das lesões coronarianas e seguimento clínico da valvopatia.

Concluindo: ECVAo é um método simples e rápido para avaliação do grau de calcificação valvar com excelente correlação estatística com os parâmetros de gravidade pelo ecocardiograma.

Sua análise deve ser considerada em casos nos quais persiste dúvida diagnóstica, especialmente nos pacientes com EAo baixo fluxo/baixo gradiente.

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Sobre o autor

Alexandre Volney

Residência em Clínica Médica pelo Hospital do Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo (HC-FMUSP, 2007)
Residência em Cardiologia pelo Instituto do Coração (InCor-HCFMUSP, 2009),
Especialização em Tomografia e Ressonância Cardiovascular (InCor-FMUSP, 2009-2011)
Especialista em Ecocardiografia (SBC)

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