Coronariopatia

Finalmente, devemos usar colchicina na coronariopatia?

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A inflamação faz parte do processo fisiopatológico da aterosclerose e das síndromes coronarianas agudas. A terapia anti-inflamatória para pacientes com síndrome coronariana aguda tem mostrado resultados promissores, mas limitados por efeitos colaterais. A colchicina é uma droga anti-inflamatória que já é usada para o tratamento de pericardite e gota, com bom perfil de segurança. A colchicina tem algum papel no tratamento da coronariopatia? Vamos revisar as evidências da literatura neste post.

Há 3 estudos principais sobre colchicina na coronariopatia. O COLCOT e o COPS incluíram pacientes com síndrome coronariana aguda e o LoDoCO 2 randomizou pacientes com doença coronariana estável.

No estudo COLCOT, 4745 pacientes com infarto em ate 30 dias, já com terapia medicamentosa otimizada, foram randomizados para tomar 0.5 mg de colchicina ao dia ou placebo. O tratamento se iniciou em média 14 dias após o evento coronariano agudo. O risco do endpoint primário comporto (morte por doença cardiovascular, parada cardíaca ressuscitada, infarto, AVC ou hospitalização por angina levando a revascularização) foi mais baixo no grupo da colchicina (HR 0.77, IC 0.61-0.96) depois de um seguimento médio de 2 anos. Esse resultado foi obtido principalmente às custas de um risco menor de angina ou AVC. A taxa de efeitos colaterais foi semelhante ao placebo.

O estudo australiano COPS randomizou 795 pacientes para colchicina (0.5 mg duas vezes ao dia por um mês, depois 1 vez ao dia por 11 meses) ou placebo, iniciado durante a primeira hospitalização. Nos 12 meses de seguimento, não houve diferença na taxa no desfecho primário composto (mortalidade por todas as causes, síndrome coronariana aguda, revascularização de urgência guiada por isquemia, e avó não cardioembólico) nos dois grupos. Houve mais mortes por todas as causas no grupo da colchicina (devendo-se levar em consideração o pequeno tamanho da amostra).

No terceiro estudo, o LoDoCo2, a colchicina reduziu os riscos de doença arterial coronariana no cenário de doentes estáveis. Foram randomizados 5.522 pacientes, sendo 85% homens, com doença arterial coronariana crônica para tomarem 0.5 mg de colchicina uma vez ao dia ou placebo. Depois de dois anos e meio, houve redução do desfecho composto primário, notadamente por redução do risco de infarto do miocárdio (HR de 0.7) e de revascularização guiada por isquemia (HR 0.75). Houve uma tendência não estatisticamente significativa de aumento de mortalidade não cardiovascular no grupo da colchicina. Não houve relato de eventos adversos significativos no grupo da colchicina, com exceção de mialgia.

Posteriormente a estes estudos, o Journal of American Heart Association publicou uma metanálise sobre o uso da colchicina no cenário agudo e crônico da doença arterial coronariana. Foram incluídos 13 estudos randomizados (n-13.125). Quando comparado a terapia padrão/placebo, houve uma redução no risco de infarto (OR 0.64 , IC 0.46-0.90 , p=0.01) e AVC/AIT (OR 0.50, IC 0.31-0.81 , p=0.005), mas sem influência na mortalidade cardiovascular ou por todas as causas. Houve ainda um aumento de efeitos colaterais gastrointestinais. Um dado interessante dessa metanálise é que não foi detectada interação significativa entre as análises de subgrupo quando comparado doença arterial coronariana aguda e crônica, quando utilizado por 30 dias ou mais, ou quando usado doses diferentes de colchicina. A taxa de descontinuação do tratamento foi de 14%.

Em dezembro de 2021, um grupo polonês publicou nova metanálise, incluindo 14 estudos (n 13186), onde a terapia com colchicina diminuiu o endpoint primário da metanálise (definido como morte cardiovascular ou infarto do miocárdio ou AVC isquêmico ou revascularização dirigida por isquemia ou injúria miocárdica relacionado com angioplastia) em 30%, notadamente por redução significativa do risco de revascularização dirigida por isquemia (RR 0.57), infarto do miocárdio (RR 0.73) , e AVC (RR 0.49). Os pacientes tratados com colchicina tiveram um aumento significativo de descontinuação do tratamento. Como na metanálise anterior, não foi encontrado um efeito significativo da droga na mortalidade total ou cardiovascular.

O Uptodate, importante referência da nossa prática clínica, recomenda o uso da colchicina para prevenção secundária dos pacientes com doença arterial coronariana clinicamente estabelecida. Nossa diretriz brasileira mais recente de síndrome coronariana aguda de 2021 não faz referência específica para utilização de colchicina no cenário agudo.

A diretriz Européia de prevenção de doença cardiovascular de agosto de 2021 faz uma recomendação IIb com nível de evidência A para o uso de colchicina 0.5 mg ao dia para pacientes com doença cardiovascular estabelecida, para prevenção secundária, particularmente para os pacientes mal controlados de outros fatores de risco cardiovascular ( diabetes , tabagismo ) ou quando controlados mas com recorrência dos eventos cardiovasculares.

Quais são então as implicações clínicas ?

A colchicina tem potencial como droga suplementar na prevenção secundária de eventos isquêmicos entre os pacientes com coronariopatia aguda ou crônica, com relativa baixa incidência de efeitos colaterais importantes.

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Sobre o autor

Carlos Frederico Costa Lopes

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