Miscelânia

Inotrópicos: 5 dicas práticas

imagem de unidade de terapia intensiva
Escrito por Eduardo Lapa

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Muita gente fica sem saber direito quando iniciar inotrópicos (ex: dobutamina, milrinone) para seus pacientes e, quando o fazem, ficam perdidas sem saber como atingir a dose adequada, por quanto tempo manter a medicação e depois como saber qual a hora correta de desmamar a droga vasoativa. Vamos para algumas dicas práticas:

1- Inotrópicos devem ser iniciados quando há evidências de má perfusão secundária à diminuição de contratilidade miocárdica.

Exemplos práticos:

  • Paciente de 70 anos iniciou com quadro de diarreia e vômitos intensos. Chega à emergência com PA 70×50, extremidades frias, mucosas secas. O pcte tem evidência de má perfusão? Sim. Há evidência desta má perfusão ser por contratilidade miocárdica diminuída? Obviamente que não! Trata-se de desidratação óbvia. O que este paciente precisa como tratamento inicial é de reposição volêmica e não de inotrópicos.
  • Paciente chegou ao hospital há 1 dia com quadro de IAM anterior extenso. Foi realizada angioplastia tardia de DA (delta de 11 H). ECG ficou com área inativa de V1 a V5. Paciente começa então a ficar com extremidades frias, PA 80×60 mmHg, FC 120 bpm, estertores em 1/2 inferior de AHT, turgência jugular evidente a 45 graus. Gasometria arterial mostra lactato aumentado, BE -7, bicarbonato 18. Há evidência de má perfusão? Obviamente que sim. Esta má perfusão parece ser secundária à contratilidade miocárdica reduzida? Sim!! Apesar de não ser citada a fração de ejeção deste paciente, tudo indica que ele esteja evoluindo com disfunção ventricular relevante. Não precisamos ter um eco em mãos para iniciar inotrópicos. O que precisamos é ter dados objetivos que corroborem a hipótese diagnóstica de diminuição da contratilidade cardíaca. Neste caso está indicado o uso de inotrópicos

2- Costuma-se iniciar o inotrópico com doses baixas/moderadas e depois vai-se titulando.

Inotrópicos possuem uma série de efeitos adversos inerentes ao seu mecanismo de ação. Costumam subir a frequência cardíaca podendo predispor a taquiarritmias e podem causar alterações da pressão arterial (tanto aumentar devido ao incremento do débito cardíaco quando diminuir devido ao componente de efeito vascular que algumas medicações possuem). Desta forma, é sempre interessante iniciar-se a medicação com doses baixas ou moderadas, avaliar o comportamento do seu paciente à beira do leito e, se ele tolerar bem a medicação, ir aumentando a infusão até a dose adequada. Mas qual esta dose? Veja abaixo.

3- A dose adequada de inotrópico vai variar de paciente para paciente.

Não há receita de bolo. Não podemos simplesmente dizer que 10 mcg/kg/min de dobutamina vai resolver o problema do paciente. O único jeito de se chegar a dose ideal para um determinado paciente é se testando na prática a medicação. Mas como vou saber qual a dose correta exatamente? Basta observar os sinais de má perfusão que lhe levaram a iniciar a droga. O que você quer com o uso do inotrópico é que aqueles sinais desapareçam. No caso do exemplo do IAM que falamos no item 1, queremos que o paciente fique bem perfundido, que a diurese volte a melhorar, que a gasometria apresente queda de lactato e aumento de bicarbonato, etc. Todos estes parâmetros têm que ser avaliados em conjunto. Depois do Survivng Sepsis observei que muitas pessoas ficaram “reféns” da saturação venosa de O2 (SvO2). Se SvO2 baixa, aumenta-se o inotrópico. Se acima de 70%, deixa quieto. Isto está incorreto!! A SvO2 é apenas mais um de inúmeros parâmetros a serem avaliados. Estou cansado de observar pctes na UTI com SvO2 de 60%, por exemplo, e com todos os outros parâmetros clínicos e laboratoriais em franca melhora após a introdução do inotrópico. Não há sentido em ficar aumentando a infusão da medicação baseado apenas nisto. Até porque há um série de questões técnicas que podem estar envolvidas (posição da ponta do catéter venoso central, diluição da amostra da gasometria com soro, demora para levar o exame para a análise laboratorial, etc). O exame sempre será complementar. A avaliação clínica global, inclusive lançando mão de outros parâmetros laboratoriais, sempre será soberana.

4- Não há tempo máximo que o inotrópico possa ser usado.

Outra falácia que já escutei muito falar é a de que podemos usar o inotrópico apenas por x dias. Isto não existe. Você irá utilizar a medicação enquanto o paciente precisar dela. Já vi pacientes que ficaram mais de 6 meses em uso de inotrópicos em fila de transplante. Sempre que se tentava baixar a medicação, o paciente descompensava. Em um mundo ideal, este paciente iria receber um dispositivo de asistência ventricular interna e aguardar ser chamado para o tx em casa, mas isto ainda está muito distante da prática clínica.

5- O desmame do inotrópico deve ser guiado pelos mesmos sinais/sintomas que orientaram a sua introdução.

Simples assim. Como faço para saber se já posso retirar o inotrópico do meu paciente. Primeira pergunat: ele já melhorou dos sinais que precipitaram o início do uso? No exemplo do IAM citado no item 1: melhorou diurese, perfusão periférica, gaso, etc? Excelente. Segunda pergunta: o fator precipitante parece ter sido controlado? Se o paciente foi mal aderente à restrição hidrossalina, já conseguiu-se resolver a hipervolemia através do uso de diuréticos? Se foi mal aderente às medicações, conseguiu-se reintrodizá-las em doses adequadas? Se estava com algum problema cirúrgico (ex: CIV pós-IAM, perfuração de valva mitral por endocardite) isto já foi resolvido? Dizendo-se sim para as duas perguntas, provavelmente o inotrópico já pode ser desmamado. Como fazer na prática/ mais uma vez não há receita de bolo. Alguns pacientes toleram desmame rápido da medicação, outros precisam de uma diminuição lenta da droga. Mais uma vez temos que ver na prática o que irá funcionar para aquele paciente. De forma prática, costumo ir reduzindo 10-20% da velocidade de infusão e observo como o paciente se comporta. Nestes casos é sempre interessante coletar uma nova gasometria após 1 ou 2 horas da diminuição da dose para observar os parâmetros de microhemodinâmica, além de, obviamente, ver como o paciente fica clinicamente (diurese, pressão, perfusão periférica, etc).

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Sobre o autor

Eduardo Lapa

Editor-chefe do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Ecocardiografia pela SBC

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