Insuficiência Cardíaca

Insuficiência cardíaca: vale a pena anticoagular todos os pacientes?

Escrito por Jefferson Vieira

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A anticoagulação oral em pacientes com IC tem sido prescrita rotineiramente baseada no alto risco de fenômenos tromboembólicos associados à tríade de Virchow: baixo débito cardíaco, disfunção endotelial e estado de hipercoagulabilidade. A IC com fração de ejeção reduzida quando associada à fibrilação atrial (FA) identifica um subgrupo de pacientes com alto risco de evento tromboembólico e o beneficio da anticoagulação está bem documentado. Entretanto, nos pacientes em ritmo sinusal e sem história pregressa de FA esse benefício é discutível. Estudos como o WASH, HELAS, WATCH e WARCEF falharam de forma consistente em demonstrar superioridade da varfarina contra a aspirina sobre desfechos primários que incluíam morte e AVC em doentes com IC sem FA. Além disso, a terapia com varfarina nestes ensaios foi associada a maior sangramento, embora o risco de hemorragia intracraniana tenha permanecido baixo.

Além da FA, outras condições relacionadas com disfunção ventricular podem estar associadas a maior risco de evento tromboembólico como a presença de trombo intracavitário e infarto com extensa área de disfunção segmentar. Dados sobre anticoagulação plena em pacientes com trombo ventricular são limitados porque a maior parte dos estudos foram realizados antes do avanço das terapias trombolíticas e percutâneas no IAM, dos estudos de dupla antiagregação plaquetária e dos escores de risco para AVC embólico (CHA2DS2VASc). O estudo WARIS II, de 2002, demonstrou benefícios da anticoagulação precoce após infarto, com redução de desfecho composto de morte, reinfarto ou AVC. Entretanto, estudos subsequentes apresentaram resultados inconsistentes e por isso o único grupo que ainda recomenda anticoagulação em pacientes com um grande infarto de parede anterior é a Heart Failure Society of America (HFSA), na sua diretriz de 2010. Na indisponibilidade de uma evidência conclusiva, a anticoagulação pode ser considerada na presença de um trombo intracavitário recente, principalmente após infarto. Por outro lado, na documentação de um trombo organizado e com mais de três meses, independente de terapia anticoagulante prévia, essa indicação é controversa.

Ensaios clínicos randomizados com os novos anticoagulantes orais (NOACs) em pacientes com IC estão em andamento. Em 2016 uma metanálise dos estudos RE-LY, ENGAGE AF-TIMI 48, ROCKET e ARISTOTLE demonstrou que os NOACs reduziram significativamente o desfecho composto de AVC/embolia sistêmica, sangramento maior e hemorragia intracraniana em pacientes com IC e FA não-valvar. Embora ainda não haja um estudo de fase 4 para avaliar a segurança dos NOACs “no mundo real”, a última diretriz européia de IC já recomenda sua prescrição em pacientes com IC e FA não-valvar.

Resumo: Na prática, portanto, a anticoagulação plena é contraindicada em pacientes com IC e ritmo sinusal, sendo indicada somente na FA ou como profilaxia secundária de eventos tromboembólicos.

Dica: Se o paciente tiver indicação de anticoagulação e antiagreção plaquetária por cardiomiopatia isquêmica, recomenda-se que, após 12 meses do evento isquêmico agudo, o paciente permaneça somente com o anticoagulante oral devido ao alto risco de sangramento da associação.

Referências:

Zeitler EP, Eapen ZJ. Anticoagulation in Heart Failure: a Review. Journal of atrial fibrillation. 2015;8(1):31-38.

Efficacy and Safety of Novel Oral Anticoagulants in Patients With Atrial Fibrillation and Heart Failure: A Meta-Analysis. JACC Heart Fail 2016;4:870-880

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Sobre o autor

Jefferson Vieira

Residência em Cardiologia pelo Instituto de Cardiologia/RS
Especialista em Cardiologia pela SBC
Especialista em Insuficiência Cardíaca e Transplante Cardíaco pelo InCor/FMUSP
Doutor em Cardiologia pela FMUSP
Médico-assistente do programa de Insuficiência Cardíaca e Transplante Cardíaco do Hospital do Coração de Messejana

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