Métodos complementares

Interpretando os resultados da tomografia coronariana – o que é o CAD-RADS?

Escrito por Alexandre Volney

Esta publicação também está disponível em: Português

Em publicação recente, com o intuito de padronizar os laudos de tomografia coronariana, assim como a conduta sugerida ao se deparar com determinados achados, a sociedade americana de tomografia cardiovascular (SCCT) em conjunto com outras entidades médicas norte-americanas (Colégio Americano de Cardiologia – ACC; Colégio Americano de Radiologia – ACR e Sociedade Norte Americana de Imagem Cardiovascular – NASCI) sugeriu a criação de um sistema semelhante ao que já acontece nos exames de outros órgãos (ex: BI-RADS no exame de mama). Chamado de CAD-RADS (Coronary Artery Disease Reporting and Data System), essa classificação pode ser utilizada em nos laudos de pacientes com ou sem doença coronariana conhecida, independente do cenário clinico (ambulatorial/estável – tabela 1) ou hospitalar/emergência/instável – tabela 2), permitindo classifica as lesões coronárias de acordo com o grau de estenose, localização, tipo de placa (“vulnerável”), presença de stent / enxertos coronários e qualidade do estudo. Essa padronização visa melhorar a interpretação do clínico sobre os achados apresentados e o como prosseguir (ou não) com a investigação28. A análise é feita per-pacient based, ou seja, o escore é definido de acordo com a pior lesão encontrada no exame, dentre todos os segmentos coronarianos estudados.

Reparem que a graduação é baseada no grau de estenose, variando de 0 (ausência de estenose coronariana) até 5 (oclusão total) conforme a tabela 1.

Tabela 1 – Classificação CAD-RADS.

 

Classificação

CAD-RADS

Grau de estenose coronariana Investigação cardíaca recomendada

 

Tratamento
0 0% Nenhuma Considerar causas não aterosclerótica de precordialgia
1 1%-24%(mínima) Nenhuma Considerar prevenção e controle de fatores de risco
2 25%-49% (leve) Nenhuma Considerar prevenção e controle de fatores de risco
3 50%-69% (moderada) Considerar avaliação funcional

 

Considerar otimização terapeutica anti-isquêmica guiada por sintomas, além de controle de fatores de risco
4A 70%-99% (grave) Considerar angiografia ou avaliação funcional

 

Considerar otimização terapeutica anti-isquëmica guiada por sintomas, além de controle de fatores de risco.

Outros tratamentos (revascularização, por exemplo) deve seguir os guidelines atuais

4B Principal esquerda >50% ou doença trivascular (>70%) Angiografia recomendada

 

5 100% oclusão total Considerar angiografia ou avaliação funcional

Adaptado de Cury RC, et al. C J Cardiovasc Comput Tomogr. 2016 Jul Aug;10(4):269-81

 Além disso, a categoria do CAD-RADS pode ser complementada com modificadores que indicam se o estudo não é totalmente interpretável (N), presença de stent (S), enxertos cirúrgicos (G) ou placas vulneráveis (V).

O objetivo do CAD-RADs, portanto, é permitir um canal de comunicação claro entre o imaginologista e o clínico responsável pelo paciente, baseado nos evidências científicos mais recentes. Essa terminologia já esta sendo incorporada em alguns serviços de tomografia cardíaca e deverá ser mais frequentemente encontrada nos laudos num futuro proximo.

Comentários pessoais: Esse tipo de sistematização de laudos (RADS) é bastante comum na radiologia geral (BI-RADS para mama, por exemplo), apresentando resultados significativos a partir da padronização dos achados de imagem e a respectiva condutas. Na maioria das vezes relacionados ao processo investigativo de neoplasias, quando aplicado a uma doença complexa como doença arterial coronária, com formas diferentes de apresentação e prognóstico, encontramos diferenças que devem ser analisadas com cautela.

A interpretação dos estudos coronarianos podem ser realizados por cardiologistas e radiologistas habilitados, com formas de descrição e enfoque dos achados diferentes. Nesse ponto, a padronização é interessante no sentido de oferecer uma resposta clara dos resultados, facilitando a interpretação do clínico solicitante.

Por outro lado, algumas situações podem causar confusão na interpretação. Por exemplo, o fato do resultado ser baseado na pior lesão encontrada no paciente, podemos ter classificações semelhantes (exemplo: lesão 50-69% – CAD-RADS 3 – indicando investigação adicional com prova funcional) para pacientes com estenose no terço proximal da descendente anterior ou em ramo marginal esquerdo, situações clínicas que poderiam ser conduzidas de forma completamente distintas em função da área miocárdica em “risco”.

A tomografia coronariana tem grande capacidade de fornecer informações sobre a parede vascular, inclusive diferenciando os estágios evolutivos da placa aterosclerótica. Nesse ponto, alguns estudos tem demonstrado subtipos específicos de placas (baixa atenuação tomográfica, remodelamento positivo, sinal de “napkin ring”) que teriam maior probabilidade de evolução para síndrome coronária aguda. Nesse ponto, a classificação auxilia com a introdução do V (placa vulnerável) à classificação, indicando a presença de placa com as alterações acima. Ainda que isso seja um ponto positivo, nem sempre existe conhecimento científico suficiente sobre como conduzir essa situação. Vejam mais um exemplo: paciente com precordialgia atípica submetido a tomografia coronária sendo identificado placa vulnerável discreta (25-49%) no terço proximal da artéria descendente anterior (CAD-RADS 2V – nenhuma investigação adicional) – Figura 1. A conduta obviamente será otimizar o tratamendo das comorbidades associadas e controle dos fatores de risco. Porém, devemos deixar esse paciente com profilaxia primária com antiagregante? Como o valor preditivo positivo da tomografia é menos robusto que o valor preditivo negativo, devemos submeter o paciente a prova funcional? Ou dada a chance de eventos ameaçadores a vida (IAM) seria melhor ser agressivo na conduta com CATE, US intracoronário? Os stents bioabsorvíveis teriam papel preventivo nesse contexto?

Figura 1. Placa com características de vulnerabilidade pela tomografia coronária.

placa-mole-copia-2

O CAD-RADS é uma classificação “viva”, deve ser utilizada com cautela porque ainda apresenta imprecisões, mas que pode ser continuamente aprimorada a partir do surgimeno de novos dados científicos correlacionando os achados do exame com evolução clínica, novas terapêuticas e dados prognósticos adicionais.

O artigo na íntegra pode ser acessado gratuitamente no link: http://scct.org/resource/resmgr/Docs/JCCT_Guidelines_CAD_RADS.pdf

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Sobre o autor

Alexandre Volney

Residência em Clínica Médica pelo Hospital do Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo (HC-FMUSP, 2007)
Residência em Cardiologia pelo Instituto do Coração (InCor-HCFMUSP, 2009),
Especialização em Tomografia e Ressonância Cardiovascular (InCor-FMUSP, 2009-2011)
Especialista em Ecocardiografia (SBC)

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