Arritmia

Já ouviu falar em marca-passo com estimulação do feixe de His?

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Já ouviu falar em marca-passo estimulação do feixe de His? Nesse post faremos uma breve revisão sobre o assunto.

A busca por uma estimulação fisiológica teve várias etapas ao longo do tempo, inicialmente por meio de dispositivos que permitiam a manutenção do sincronismo atrioventricular, pela ativação do átrio e ventrículo de forma sequencial no intervalo adequado para o enchimento ventricular, tal como se observa no marcapasso bicameral em modo DDD. A incorporação de biossensor para ajuste automático da frequência cardíaca já na década de 80, indicado pela letra R no código NGB (p.ex.: modo VVIR e DDDR) permitiu o aumento da FC com o esforço, em casos de incompetência cronotrópica.

Na era da ressincronização cardíaca, as consequências deletérias da ativação no bloqueio de ramo esquerdo e da estimulação convencional do VD (apical), com QRS largo, ficaram evidentes após vários estudos, por causar dissincronia e induzir disfunção ventricular, ou piorar a disfunção ventricular preexistente. Lembrando que quando o marca-passo é colocado no VD, ele gera um padrão de bloqueio de ramo esquerdo (vide figuras abaixo):

Portanto, o marcapasso bicameral convencional, em modo DDD, mantém o sincronismo AV, porém, a estimulação ventricular geralmente é realizada por meio de eletrodo implantado na região apical ou septo do VD, o que causa dissincronia elétrica e mecânica.

Como consequências, estratégias de programação têm sido desenvolvidas para minimizar a estimulação do VD, como algoritmos que aumentam o intervalo AV (IAV), permitindo que o marca-passo opere estimulando o átrio, com estimulação ventricular de backup (AAIDDD). Porém, o IAV muito largo pode gerar dissincronia atrioventricular e, em casos com BAV 2º ou 3º permanente, a estimulação ventricular será necessária. Ademais, redução em desfechos duros não tem sido observado com esta estratégia.

Em pacientes com insuficiência cardíaca sintomática e tratamento medicamentoso otimizado, fração de ejeção ≤ 35% e ECG com QRS largo, a terapia de ressincronização cardíaca proporciona, de forma bem estabelecida, melhora clínica e redução de mortalidade. A estimulação biventricular é normalmente obtida com um eletrodo de estimulação endocárdica no ventrículo direito e um eletrodo epicárdico situado no ventrículo esquerdo, em uma veia coronária, acessível pelo seio coronário. Entretanto, esta terapia apresenta limitações, como ausência de boa resposta em cerca de 30% dos pacientes, que são considerados “não respondedores”, bem como insucesso em cateterizar o seio coronário e posicionar o eletrodo de VE em posição adequada pela anatomia desfavorável, estimulação frênica e benefícios clínicos duvidosos em pacientes com QRS mais não tão largos ou com padrão de bloqueio de ramo direito. Exemplo de ECG com QRS mais estreito que o esperado para um ritmo de marca-passo:

A estimulação de His foi proposta como uma forma mais fisiológica de estimulação ventricular, que pode ser usada como alternativa à estimulação convencional do VD ou à ressincronização (marca-passo biventricular). Na estimulação de His, um eletrodo com desenho específico (eletrodo de fixação ativa com screw longo) penetra no feixe de His, o que permite a estimulação de suas fibras, e o estímulo é conduzido através do sistema nativo de His-Purkinje, proporcionando um QRS estreito com eixo elétrico e morfologia mais próximo do normal. A figura abaixo serve para relembrar onde fica o feixe de His:

A captura do feixe His pode ser seletiva ou não seletiva. Na captura seletiva apenas as fibras do feixe de His são estimuladas e a ativação ocorre diretamente por meio do sistema His-Purkinje. Durante a captura seletiva, no ECG se observa um retardo (intervalo isoelétrico) entre a espícula e o complexo QRS. Com a captura não seletiva, tanto as fibras do feixe de His quanto o miocárdio local são capturados. Nesta forma de captura, uma pseudo onda delta no ECG de superfície é observada.

Ensaios clínicos estão avaliando os benefícios desta terapia, seja como alternativa a estimulação convencional do VD, seja como alternativa ou associada à terapia de ressincronização.

Resultados de estudos pequenos com estimulação de His têm sido publicados. O His-SYNC, 1º estudo randomizado,  contou com 41 pacientes não demonstrou melhora significante com a estimulação de His (His-P) quando comparada à estimulação biventricular, porém um erro tipo II não pode ser excluído (pela amostra pequena). Pacientes que receberam His-P apresentaram maiores limiares de estimulação e tendência a maior redução na duração do QRS.

Recentemente, o His-Alternative Trial randomizou 50 pacientes com indicação de terapia de ressincronização, para implante de HIS-P ou marca-passo biventricular, como primeira estratégia. A estimulação de His resultou em encurtamento significativo do QRS e melhorias significativas nos parâmetros ecocardiográficos, bem como melhora nos sintomas e na capacidade física, de forma comparável a melhora observada naqueles submetidos a implante de marcapasso biventricular (dados apresentados no virtual European Heart Rhythm Association 2021 congress). O limiar de estimulação ventricular foi significativamente maior com His-P do que com a estimulação biventricular.

CONCLUSÕES

Marca-passo com estimulação do feixe de His é uma técnica capaz de proporcionar uma estimulação cardíaca mais fisiológica e promover um padrão melhor de sincronia intraventricular quando comparada com a estimulação crônica do ventrículo direito. A estimulação de His também pode ser uma técnica alternativa à terapia de ressincronização cardíaca, ou ser utilizada em casos selecionados de pacientes com insuficiência cardíaca não elegíveis para CRT.

Uma desvantagem do HBP é que energias mais altas do marca-passo tendem a ser necessárias para atingir a captura do feixe de His em comparação com a captura de VD e mesmo em relação ao eletrodo do ventrículo esquerdo em ressincronizador, o que tenderá a causar esgotamento mais rápido da bateria do gerador. Adicionalmente, é um procedimento tecnicamente desafiador que exige uma curva de aprendizagem do operador, ainda com uma taxa de insucesso.

Estudos com maior número de pacientes definirão melhor o valor dessa terapia.

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Sobre o autor

Nestor Oliveira Neto

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