Arritmia

Lamotrigina aumenta o risco de arritmias cardíacas?

Escrito por Eduardo Melo

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O FDA fez recente acréscimo na bula da lamotrigina, advertindo quanto ao aumento do risco de arritmias cardíacas, através de atividade antiarrítmica classe IB em concentrações terapeuticamente relevantes (estudos in vitro).

Mas o que há de novo na bula da lamotrigina?

 – A lamotrigina pode retardar a condução ventricular (alargar o QRS) e induzir arritmia, incluindo morte súbita, em pacientes com doença cardíaca estrutural ou isquemia miocárdica. Portanto, evite o uso de lamotrigina em pacientes com distúrbios de condução cardíaca (por exemplo, bloqueio cardíaco de segundo ou terceiro grau), arritmias ventriculares ou doença ou anormalidade cardíaca (por exemplo, isquemia miocárdica, insuficiência cardíaca, doença cardíaca estrutural, síndrome de Brugada, ou outras canalopatias de sódio). O uso concomitante de outros bloqueadores dos canais de sódio pode aumentar o risco de pró-arritmia.

– A lamotrigina inibe os canais de sódio cardíacos humanos com cinética de início e deslocamento rápido e forte dependência de voltagem, consistente com outros agentes antiarrítmicos da classe IB (vide mapa mental abaixo). A lamotrigina não retardou a condução ventricular (alarga QRS) em indivíduos saudáveis, entretanto, pode retardar a condução ventricular e aumentar o risco de arritmia em pacientes com cardiopatia estrutural ou isquemia miocárdica. Frequências cardíacas elevadas também podem aumentar o risco de desaceleração da condução ventricular com lamotrigina.

Diante disso, The   International   League   Against   Epilepsy   (ILAE)   /   American  Epilepsy  Society  (AES)  realizou força-tarefa para responder as principais sobre o tema dúvidas baseadas em evidências.

ESTAS ADVERTÊNCIAS E PRECAUÇÕES SÃO APENAS RELEVANTES PARA A LAMOTRIGINA OU TAMBÉM SÃO APLICÁVEIS PARA OUTROS BLOQUEADORES DO CANAL DE SÓDIO?

As preocupações quanto aos efeitos cardíacos decorrem das propriedades de bloqueio do canal de sódio da lamotrigina. Nenhuma diferença na ocorrência de anormalidades no ECG foi relatada em dois pequenos estudos que compararam lamotrigina com carbamazepina, incluindo especificamente idosos com epilepsia. Uma interação farmacodinâmica sinérgica com outras substâncias com propriedades bloqueadoras dos canais de sódio pode ser esperada e potencialmente aumentar o risco de efeitos cardíacos adversos.

ESTUDOS EM HUMANOS FORAM REALIZADOS PARA AVALIAR ISSO?

Embora os dados in vitro indiquem que a lamotrigina tem propriedades antiarrítmicas de bloqueio dos canais de sódio classe IB, não há alteração na condução ventricular (duração do QRS) em indivíduos saudáveis e indivíduos com epilepsia sem doença cardíaca.

Um aumento modesto no intervalo de condução AV (prolongamento PR) pode ocorrer, especialmente em altas doses. Em altas doses de lamotrigina, observa-se um leve encurtamento do intervalo QT, que é uma propriedade de classe IB. Assim, não há risco de arritmia aparente da terapia com lamotrigina em pessoas saudáveis ​​sem doença cardíaca.

Atenção! Repetindo: lamotrigina não alarga intervalo QT, podendo, inclusive, encurtá-lo.

EXISTEM DADOS DE QUE ARRITMIAS OU MORTES SÚBITAS POR PROBLEMAS CARDÍACOS SÃO MAIS COMUNS EM PESSOAS QUE TOMAM LAMOTRIGINA EM COMPARAÇÃO COM OUTROS FÁRMACOS ANTI-CRISE?

Não foi demonstrado risco aumentado de arritmias ou mortes súbitas devido a problemas cardíacos ou necessidade de terapia de marca-passo em pessoas em uso de lamotrigina em comparação com outros fármacos anti-crise. A morte súbita inesperada na epilepsia (SUDEP) é, no entanto, relativamente comum em pessoas com epilepsia. Em adultos com epilepsia, a taxa geral de SUDEP é de aproximadamente 1:1.000/ano, mas o risco é maior em pessoas com epilepsia não-controlada e crises convulsivas frequentes. Assim, um aumento na morte súbita cardíaca causada pela lamotrigina poderia, teoricamente, passar despercebido se ocorresse com uma frequência muito baixa em relação ao risco de SUDEP.

DEVO FAZER ECG EM MEUS PACIENTES SAUDÁVEIS PARA PROCURAR DOENÇA CARDÍACA SUBJACENTE?

Em pessoas com mais de 60 anos, a probabilidade de anormalidades de condução cardíaca não diagnosticadas aumenta, e um eletrocardiograma pode ser considerado antes de se iniciar a lamotrigina. Um eletrocardiograma também deve ser considerado em pessoas com menos de 60 anos com doença cardíaca conhecida ou fatores de risco para doença cardiovascular. Anormalidades de  ST e  onda T não são preocupantes e não devem impedir a prescrição de lamotrigina para esses indivíduos.

Os casos de maior risco são aqueles com bloqueio cardíaco de 2º e 3º graus, síndrome de Brugada, cardiomiopatia ventricular arritmogênica (CAVD), bloqueio de ramo esquerdo (BRE) e bloqueio de ramo direito (BRD) com bloqueio fascicular anterior ou posterior esquerdo. Esses pacientes requerem investigação cardiológica completa para determinar se a lamotrigina pode ser administrada com segurança.

FREQUENTEMENTE FÁRMACOS ANTI-CRISE PRECISAM SER INICIADOS O MAIS RAPIDAMENTE POSSÍVEL APÓS O DIAGNÓSTICO DE EPILEPSIA. TENHO QUE ESPERAR PARA INICIAR LAMOTRIGINA ATÉ OBTER OS RESULTADOS DO ECG?

Como a lamotrigina deve ser iniciada lentamente (aumento de dose  diária de 25 mg a cada semana), o ECG inicial pode ser obtido durante o início da titulação , principalmente porque os eventos adversos cardíacos estão dose-dependentes.

UMA VEZ QUE UM INDIVÍDUO ESTIVER EM LAMOTRIGINA O ECG PRECISA SER REPETIDO?

A repetição do ECG deve ser feita quando a dose alvo (ou o nível sérico de lamotrigina) está próximo ou acima do limite superior da faixa terapêutica e sempre na presença de uso concomitante de outros bloqueadores dos canais de sódio ou substâncias conhecidas por prejudicar o coração atrioventricular e/ou intraventricular condução.

EXISTEM OUTRAS SITUAÇÕES CARDIOVASCULARES COM AS QUAIS DEVO ME PREOCUPAR, PRINCIPALMENTE PARA PESSOAS QUE JÁ ESTÃO USANDO LAMOTRIGINA?

Os médicos devem considerar obter uma consulta de eletrocardiograma e/ou cardiologia em pessoas em uso de lamotrigina com síncope ou pré-síncope de início súbito com perda do tônus ​​muscular sem causa vasovagal ou ortostática clara.

Resumo da ópera: a lamotrigina continua sendo uma execelente opção terapêutica para tratamento da Epilepsia. Os efeitos adversos no ritmo e condução cardíaca não são frequentes, porém a realização de um ECG em pacientes com mais de 60 anos e naqueles com fatores de risco cardiovascular (em qualquer idade) torna o seu uso mais seguro.

Referências

French JA, Perucca E, Sander JW, et al. FDA safety warning on the cardiac effects of lamotrigine: An advisory from the Ad Hoc ILAE/AES Task Force. Epilepsia Open. 2021;6:45– 48. https://doi.org/10.1002/epi4.12475

Harmer  AR,  Valentin  JP,  Pollard  CE.  On  the  relationship  between  block of the cardiac Na⁺ channel and drug- induced prolongation of the QRS complex. Br J Pharmacol. 2011;164(2):260– 73

Saetre E, Abdelnoor M, Amlie JP, Tossebro M, Perucca E, Taubøll E, et al Cardiac function and antiepileptic drug treatment in the el-derly: a comparison between lamotrigine and sustained- release carbamazepine. Epilepsia. 2009;50(8):1841– 9

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