Imagen Cardiovascular Miocardiopatias

Ressonância Nuclear Magnética Cardíaca e Miocardite pós COVID. Poderia esse método melhorar a capacidade diagnóstica ?

Escrito por Silvio Póvoa

Esta publicação também está disponível em: Português

Um interessante estudo publicado em 2021 (1) no JAMA veio trazer um interessante questionamento. Qual a prevalência de miocardite em atletas que tiveram COVID-19 e a diferença nos métodos de screening.  Durante os dois últimos anos, a infeção pelo Sars-Cov2 tem trazido importante morbimortalidade ao redor do mundo. Atletas são uma população com cuidado especial, seja por exposição frequente ao contato com diversas pessoas, seja pela possibilidade do desenvolvimento de miocardite e pela miocardite ser potencial causa de morte súbita no esporte. Por isso, cresce o interesse pelos achados de ressonância magnética no rastreamento de miocardite por COVID.  Após um evento infeccioso cunha-se o termo “return to play”, no qual protocolos de investigação , preparação e manejo do retorno ao treinamento e competição do atleta acontecem. (Mais detalhes sobre miocardite por COVID, checa este nosso post https://d3gjbiomfzjjxw.cloudfront.net/coronavirus-pode-causar-miocardite/)

A Big Ten é uma Conferëncia Esportiva Universitária do NCAA Americano (Liga Esportiva Universitária) com 14 Universidades. Dessa forma, 13 dessas Universidades rastrearam seus atletas que tiveram covid . Cada Universidade tinha um investigador principal que fornecia dados de atletas testados , e diagnosticados com COVID pelo método PCR, além do número de indivíduos submetidos a Ressonância Nuclear Magnética do Coração (RNM) , e desses, quantos fechavam diagnóstico para miocardite pelo Lake Louise Criteria (LLC) 2018.  Os pacientes com RNM alterada também foram testados com Ecocardiograma, Eletrocardiograma e dosagem de troponina.

 

9255 Atletas foram testados com PCR Covid

2810 tiveram teste positivo para covid.

2461 tiveram avaliação cardiológica , 349 aguardam avaliação

1597 fizeram Ressonância Nuclear Magnética, 864 não fizeram

37 (2.3%) tiveram diagnóstico de miocardite. Destes, 9 tinham sintomas compatíveis com o quadro e 28 eram assintomáticos (miocardite subclínica)

 

Dos 28 assintomáticos, 8 tinham testes cardíacos anormais, sendo

  • 1 alteração eletrocardiográfica
  • 3 alterações ecocardiográficas
  • 4 tiveram troponina alterada

 

Dos 9 sintomáticos, 5 tveram alterações em ECG, Ecocardiograma ou troponina.

Dessa forma, dos 37 pacientes com miocardite, 20 não apresentavam sintomas, ou alterações em exames (ecocardiograma, ecg ou troponina)

 

Achados na ressonância 

Dos 37 pacientes com miocardite por COVID na ressonância magnética:

– 31 tiveram achados na RNM com critérios diagnósticos para miocardite (LLC)

– dos 6 sem critérios diagnósticos  de imagem pelo LLC, 3 tiveram miocardite por critérios clínicos , 1 atleta relatou dispneia com achados de perda de função ventricular em ecocardiograma e RNM, onde também foi visto derrame e inflamação pericárdica. Os outros 2 atletas com miocardite clínica relataram dor toråccia e tinham na RNM realce tardio em padrão típico para miocardite.

 

– dos 3 atletas com miocardite subclínica e RNM sem achados para diagnóstico por LLC, 2 demonstraram função sistólica reduzida e padrões de realce tardio típicos de miocardite, portanto demonstrando critérios de suporte. O terceiro atleta teve na RNM extenso realce tardio com padrão típico e miocardite sem evidência de edema miocárdico no MAPA T2.

 

Não houve diferença pelo LLC e pela imagem de RNM entre pacientes com diagnóstico subclínico (25 de 28 [89.3%]) vs clínico (6 de 9 [66.7%]) (diferença = 22.6% [95% CI, −7.1% to 57.7%; P = .14) . 27 dos 37% (73%) fizeram RNM entre 4-14 semanas.

A partir disso dois padrões foram vistos

  • Completa resolução das anormalidade no MAPA T2 e do realce tardio em 11 dos 27 atletas (40,7%)
  • Completa resolução das anormalidades no MAPA T2 mas persistência do realce tardio em 16 dos 27 atletas (59,3%)

 

Dos 6 pacientes com miocardite clínica por COVID, 1 demonstrou resolução da imagem na ressonância. Dos 21 atletas com miocardite subclínica  10 demonstraram completa resolução da inflamação e do realce tardio com tempo médio de 7.7 semanas.

No estudo 2,3% dos atletas tiveram o diagnostico de miocardite por COVID na ressonância (clínica ou subclínica). Miocardite é um significativo fator de risco de morte súbita em atletas, especialmente nos jovens. Formas diferentes de screening  podem promover diferentes estimativas e rastreio de miocardite, além de que diferentes softwares , protocolos técnicas podem fazer com que os resultados sejam diferentes.           

Conclusão do estudo

2.3% dos atletas diagnosticados com infecção por SARS-COV2 tiveram evidências de miocardite clínica ou subclínica. Isso pode impactar a forma de investigar atletas que tiveram COVID quanto ao rastreio de miocardite . Isso permitiu uma taxa de diagnóstico 7.4x maior do que a triagem por sintomas, eletrocardiograma, ecocardiograma e troponina

Opinião do autor

O estudo traz pra nossa atenção o fato da miocardite poder ser um evento presente em atletas pós covid. De fato, a miocardite é um evento presente em pacientes pós covid, e sua incidência parece estar tão maior quanto mais grave o caso.  Dentro da população de atletas existe o interesse específico em rastrear miocardite uma vez que a alta intensidade do esporte pode ser o momento para o aparecimento de algum evento cardiovascular.

 

Vale lembrar que a Miocardite está dentro das principais causas de morte súbita em atletas, podendo corresponder a 8% dos eventos. Notou-se que adicionar a ressonância permitiu aumentar o diagnóstico de miocardite por COVID em 7.4 vezes

Por outro lado, vale lembrar que estamos falando de um estudo único e que esse resultado não é consistente com outros achados.

 

Em interessante discussão de 2022(2), Zorzi et al trouxeram um interessante estudo.  Apenas 1 de 147 atletas receberam o diagnóstico de miocardite de acordo com o Lake Louse Criteria.  Em 6 outros atletas outros achados de RNM foram evidenciados, sem necessariamente corresponder a inflamação miocárdica. A preocupação ficaria com a possibilidade de overdiagnosis, uma vez que o Realce tardio miocárdio pode ser inclusive presente em até 30% dos atletas (3)

 

De fato, Petek et al (4) em estudo publicado no British Medical Journal demonstraram  4% de sintomas do ponto de vista cardiorrespiratório em atletas no return to play.  Naqueles que tiveram sintomas de dor torácica e se submeteram a RNM, 20,8% receberam o diagnóstico de envolvimento cardiovasculares, ao mesmo tempo que não houve evidência de miocardite nos assintomáticos que se submeteram a RNM.

 

O posicionamento de 2021 do BMJ ainda deixa que a avaliação do atleta com COVID leve ou assintomático inicialmente se dê por avaliação clínica e eletrocardiograma, enquanto os com sintomas importantes mereceriam uma avaliação cardiológica pormenorizada (5). A SBC se posicionou em 2020 sugerindo em esportistas e atletas avaliação clínica e eletrocardiograma, sendo a Ressonância Nuclear Magnética possível estratégia diagnóstico em quem apresentasse alterações na triagem inicial ou em casos de COVID grave. (6)

 

Referências

 

1.Daniels CJ, Rajpal S, Greenshields JT, Rosenthal GL, Chung EH, Terrin M, Jeudy J, Mattson SE, Law IH, Borchers J, Kovacs R, Kovan J, Rifat SF, Albrecht J, Bento AI, Albers L, Bernhardt D, Day C, Hecht S, Hipskind A, Mjaanes J, Olson D, Rooks YL, Somers EC, Tong MS, Wisinski J, Womack J, Esopenko C, Kratochvil CJ, Rink LD; Big Ten COVID-19 Cardiac Registry Investigators. Prevalence of Clinical and Subclinical Myocarditis in Competitive Athletes With Recent SARS-CoV-2 Infection: Results From the Big Ten COVID-19 Cardiac Registry. JAMA Cardiol. 2021 Sep 1;6(9):1078-1087. doi: 10.1001/jamacardio.2021.2065. PMID: 34042947; PMCID: PMC8160916. (https://jamanetwork.com/journals/jamacardiology/fullarticle/2780548) 

2. Zorzi A, Cipriani A, Corrado D COVID-19 viral infection and myocarditis in athletes: the need for caution in interpreting cardiac magnetic resonance findings British Journal of Sports Medicine Published Online First: 07 April 2022. doi: 10.1136/bjsports-2022-105470

3.Androulakis E, Mouselimis D, Tsarouchas A, et al. The role of cardiovascular magnetic resonance imaging in the assessment of myocardial fibrosis in young and veteran athletes: insights from a meta-analysis. Front Cardiovasc Med 2021;8:784474.

4.Petek BJ, Moulson N, Baggish AL For the ORCCA Investigators, et al Prevalence and clinical implications of persistent or exertional cardiopulmonary symptoms following SARS-CoV-2 infection in 3597 collegiate athletes: a study from the Outcomes Registry for Cardiac Conditions in Athletes (ORCCA) British Journal of Sports Medicine 2022;56:913-918.

5.Baggish A, Drezner JA, Kim J, et al Resurgence of sport in the wake of COVID-19: cardiac considerations in competitive athletes British Journal of Sports Medicine 2020;54:1130-1131.

6.Colombo CSSS, Leitão MB, Avanza Junior AC, Borges SF, Silveira ADD, Braga F, Camarozano AC, Kopiler DA, Lazzoli JK, Freitas OGA, Grossman GB, Milani M, Nunes MB, Ritt LEF, Sellera CAC, Ghorayeb N. Position Statement on Post-COVID-19 Cardiovascular Preparticipation Screening: Guidance for Returning to Physical Exercise and Sports – 2020. Arq Bras Cardiol. 2021 Jun;116(6):1213-1226. Portuguese, English. doi: 10.36660/abc.20210368. PMID: 34133609; PMCID: PMC8288531.

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