Arritmia ECG Terapia Intensiva Cardiológica

Fibrilação Atrial no Pós-Operatório de Cirurgias não Cardíacas: anticoagular ou não?

Escrito por Pedro Veronese

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O risco de eventos tromboembólicos a longo prazo em pacientes que desenvolveram fibrilação atrial (FA) no pós-operatório de cirurgias não cardíacas ainda não é bem conhecido. A rigor, quando uma FA tem causa reversível, e esta é corrigida, a maioria dos médicos tendem a não prescrever anticoagulantes a médio e longo prazo, independentemente do escore CHA2DS2VASc. Se o pós-operatório é uma fase de inflamação e de distúrbios hidroeletrolíticos, uma vez vencido este período, seria lógico imaginar que aquele episódio de arritmia atrial não mais ocorreria. Mas o que dizem as evidências?

Um estudo recentemente publicado, analisou milhares de pacientes de um registro dinamarquês entre 1996 a 2015. Os pesquisadores compararam um grupo de 3.830 pacientes sem história de FA prévia, que desenvolveram esta arritmia no pós-operatório de cirurgias não cardíacas, com um grupo de 15.320 pacientes já sabidamente portadores de FA não valvar. Os grupos foram pareados para idade, sexo, insuficiência cardíaca, hipertensão arterial sistêmica, diabetes, tromboembolismo prévio e doença isquêmica do coração.

Os pacientes do grupo sem FA prévia e que fizeram esta arritmia no pós-operatório de cirurgias não cardíacas receberam menos anticoagulação dentro dos primeiros 30 dias da alta hospitalar em relação ao outro grupo; 24,3% vs 41,3% (p < 0,001). O risco de eventos embólicos foi semelhante nos dois grupos; 31,7 vs 29,9 eventos por 1.000 pacientes/ano (HR 0,95, 95% IC: 0,85 a 1,07). A anticoagulação durante o follow-up foi associada a uma redução de eventos embólicos semelhantes, tanto no grupo sem FA prévia (HR 0,52; 95% IC: 0,40 a 0,67) como no grupo com FA prévia (HR: 0,56; 95% IC: 0,51 a 0,62), quando comparados aos pacientes que não receberam anticoagulação.

Os autores concluíram que a FA de início recente, no pós-operatório de cirurgias não cardíacas, foi associada a um risco de eventos tromboembólicos similar ao de pacientes com FA não valvar a longo prazo.

Comentários do Cardiopapers:

Mas o que as diretrizes falam?

  1. FA no pós-operatório está associada a um aumento precoce de AVC, de morbidade e mortalidade em 30 dias.
  2. A longo prazo, pacientes com um episódio de FA no pós-operatório têm 2 vezes mais chance de morte cardiovascular e aumento importante do risco de desenvolver FA / AVCi no futuro em relação aos pacientes que nunca tiveram esta arritmia.
  3. A anticoagulação oral na alta tem sido associada à redução de mortalidade a longo prazo nesses pacientes com FA no pós-operatório, porém ainda faltam evidências de estudos controlados.

Conclusão:

Ainda faltam boas evidências para se concluir que a anticoagulação a longo prazo pode prevenir eventos embólicos nesta população e se curtos episódios de FA no pós-operatório têm o mesmo risco de episódios mais prolongados. Porém, o estudo acima é mais uma evidência de que a FA no pós-operatório deve ser avaliada, à luz do conhecimento atual, de forma individualizada, pois mesmo sendo afastado o fator agressor causal da arritmia, não há garantias sobre a benignidade do quadro a médio e longo prazo.

Referências:

  1. J Am Coll Cardiol. 2018 Oct 23;72(17):2027-2036.
  2. Eur Heart J. 2016 Oct 7;37(38):2893-2962.

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Sobre o autor

Pedro Veronese

Médico Especialista em Clínica Médica pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Cardiologista, Arritmologista e Eletrofisiologista pelo InCor-HCFMUSP.
Médico Especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC.
Médico Especialista em Arritmia Clínica e Eletrofisiologia pela Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas - SOBRAC.
Médico do Centro de Arritmias Cardíacas do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
Doutor em Cardiologia pelo InCor - HCFMUSP.
Preceptor da Residência de Clínica Médica do Hospital Estadual de Sapopemba e Hospital Estadual Vila Alpina.
Médico Chefe de Plantão do Pronto Socorro Central da Santa Casa de São Paulo.
Professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Professor da Faculdade de Medicina UNINOVE.

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