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Série cardio-oncologia – avaliação da função ventricular

Esta publicação também está disponível em: Português

Texto: Dr Eduardo Castro – especialista em Cardiologia pelo Incor-HCFMUSP

A lesão do miocárdio pode ocorrer como efeito adverso do tratamento antineoplásico, em especial de certos tipos de quimioterápicos. À medida que a eficácia dos tratamentos antineoplásicos tem melhorado, a ocorrência de eventos cardiovasculares significantes é cada vez mais comum.

Hoje vamos fazer uma breve discussão sobre métodos de avaliação ventricular para pacientes que estão fazendo ou irão iniciar esquema de quimioterapia.

Todos os pacientes, independente da idade ou de qual esquema irá ser realizado, deveriam fazer uma avaliação de função ventricular. Isto porque o próprio câncer tem sido implicado como causador de dano miocárdico1.

Alguns detalhes da história clínica são relevantes nestes casos. Entre os antecedentes tradicionais deve estar claro se o paciente já necessitou de alguma internação prolongada anteriormente (com múltiplos exames de radiação de tórax) e se houve necessidade de uso de hemoderivados (para pesquisa de hepite C e HIV – na Asia estaa são as principais causas de miocardite).

Ao solicitar exames de imagem o médico deve estar especialmente atento à necessidade a alguns pontos específicos. Para tal é crucial uma excelente comunicação entre o cardiologista e o oncologista2.

  1. Qual o potencial de cardiotoxicidade das medicações que serão administradas?

  2. Qual a necessidade de reavaliação?

A cardiotoxicidade relacionado à quimioterapia pode ocorrer de duas formas diferentes4:

Padrão de lesão miocárdica pelas drogas cardiotóxicas:

Tipo I

DOXORRUBICINA

Tipo II

TRAZTUZUMAB

Curso clínico e resposta às drogas antirremodelamento

Pode estabilizar, mas subjacente dano parece ser permanente e irreversível; recorrência em meses ou anos pode estar relacionada com o stress cardíaca sequencial

Alta probabilidade de recuperação (ou perto o estado cardíaco linha de base) em 2-4 meses após a interrupção (reversível)

Efeito da dose

DOSE DEPENDENTE

NÃO É DOSE DEPENDENTE

Reposta em caso de novo ciclo

Provavel disfunção progressiva e recorrência após a interrupção do tratamento, com prognóstico pior para os casos que desenvolvem disf progressiva.

A evidência crescente para a segurança relativa do novo ciclo (dados adicionais necessários)

Aspecto ultraestrutural

Vaculização dos cardiomiócitos; progride com desarranjo miofibrilar e em estágios mais avançados apoptose.

Não há anormalidades ultra-estruturais aparentes

Entre os exames que podemos usar para avaliar a função ventricular destacam-se:

  1. Ecocardiograma transtorácico com Doppler

  2. Ecocardiograma tridimensional

  3. Ecocardiograma com avaliação de Strain

  4. Ressonância de coração com pesquisa de realce tardio

  5. Cintilografia para avaliação de função ventricular (MUGA)

O ecocardiograma com Doppler transtorácico é o exame mais utilizado para se definir a função ventricular pré-quimioterapia. O fato de ser o mais comum não significa que o exame seja o mais apropriado. Entre os principais fatores que representam dificuldades na uniformidade do ECO TT são a variabilidade interobservador (cerca de 15%) e a dificuldade de se estabelecer imagens com boa janela para se ter uma definição apropriada para aferição.

Vantagens e desvantagens de avalição de deformação ventricular ECO TT6

ECO TT : METÓDO DE ESCOLHA – SIMPSON

VANTAGENS

Ampla disponibilidade

Não é necessário software especifico

Pode ser feito a beira leito

Menor custo

DESVANTAGENS

Forte dependência da qualidade das imagens ecocardiográficas 2D

Variabilidade interobservador elevada

Fornece informações tardias

Depende de janela adequada

Dependente de pré e pós carga

Vantagens e desvantagens de avalição de deformação ventricular

STRAIN6

VANTAGENS

Superioridade na predição de mortalidade por qualquer causa na população em geral em comparação com FEVE

Melhorou a estratificação de risco em pacientes com HF

Capacidade de reconhecer a disfunção LV precoce em pacientes submetidos a terapia potencialmente cardiotoxica e permite avaliar prognóstico.

Reprodutível quando realizado por operadores treinados

DESVANTAGENS

Forte dependência da qualidade das imagens ecocardiográficas 2D

Influenciado por condições de carga

Falta de longo prazo ensaios clínicos randomizados que avaliaram a capacidade de GLS para prever diminuições persistentes na FEVE ou sintomática HF

A falta de dados sobre a reprodutibilidade da GLS em centros não acadêmicos ou hospitais comunitários

Necessidade de software específico

Vantagens e desvantagens de avalição de deformação ventricular

ECO 3D6

VANTAGENS

Melhor acurácia na detecção de toxidade precoce

Melhor padrão de reprodutibilidade quando realizado por operadores treinados

Melhor estimativa de prognóstico.

Indicação ampla ( tanto na lesão miocárdica por drogas como por radioterapia)

DESVANTAGENS

Custo muito elevado

Baixa disponibilidade

Necessidade de treinamento especifico para os operadores

Necessidade de software específico

Vantagens e desvantagens de avalição de deformação ventricular

Ressonância de coração com pesquisa de realce tardio6

VANTAGENS

Padrão ouro na avaliação da função ventricular

Excelente padrão de reprodutibilidade – inclusive com a facilidade de reavaliação por outros profissionais com imagens gravadas em DVD

Capacidade de avaliar percentual de fibrose e estimar prognostico

Indicação ampla ( tanto na lesão miocárdica por drogas como por radioterapia)

Consegue fornecer imagens e avaliação do pericárdio e acometimento valvar

DESVANTAGENS

Custo muito elevado

Baixa disponibilidade

Necessidade de treinamento especifico para os operadores

Necessidade de software específico

A definição de cardiotoxicidade pelo ecocardiograma bidimensional varia bastante a depender da referência consultada. A maneira mais prática de se definir seria:

  • Queda de 10% da fração de ejeção basal para um valor menor que 53%;(este exame pode ser confirmado por outro método, principalmente quando a janela não for boa);

  • Disfunção reversível quando houver recuperação para uma valor onde a queda final represente menos de 5% do valor basal

  • Disfunção irreversível: recuperação < 10% da linha de base permanecendo a disfunção > 5% da lonha de base.

Como deve ser feito o segiomento dos pacientes:

DOSE CUMULATIVA DE ANTRACICLINA (mg/m2)

Antes do TT

Durante o TT

Ao final do tratamento

Primeiro ano após o tt

2o ao 5o após o tratamento

> 5 a após o tratamento

< 200

SIM

Quando clinicamente indicado

SIM

Controle com 1 ano

Controle com 2a e 5a

Apenas quando clinicamente indicado

200 – 300

SIM

Após 200 mg/m2

SIM

6 meses e 1 ano

Controle com 2a, , 3a e 5a

Apenas quando clinicamente indicado

300 – 400

SIM

Após 200, 300,

350 mg/m2

SIM

3 meses, 6 meses e 1 ano

Anual

Controle a cada 2 anos

> 400

SIM

Após 200, 300,

350 e 400 mg/m2

SIM

Anual

Controle anual

Monitoramento cardíaco inclui: consulta cardiológica, avaliação de função ventricular e dosagens de troponina e ProBNP (apenas após cada ciclo quimioterápico). ** As doses cumulativas são referentes a dozorrubicina; para o Mitoxantrone, multiplica-se a dose por 0,2, para epirrubicina e as preparações lipossomais multiplica-se por 1,5

Referencias:

  1. Pavo N, Raderer M, Hülsmann M, et al. Cardiovascular biomarkers in patients with cancer and their association with all­cause mortality. Heart 2015; DOI:10.1136/heartjnl­2015­307848. Article

  2. Todaro MC, Oreto L, Qamar R, Paterick TE, Carerj S, Khandheria BK. Cardioncology: state of the heart. Int J Cardiol. 2013;168:680-7. ?

  3. Bowles EJ, Wellman R, Feigelson HS, Onitilo AA, Freedman AN, Delate T, Allen LA, Nekhlyudov L, Goddard KA, Davis RL, Habel LA, Yood MU, McCarty C, Magid DJ, Wagner EH;Pharmacovigilance Study Team. Risk of heart failure in breast cancer patients after anthracycline and trastuzumab treatment: a retrospective cohort study. J Nat l Cancer Inst. 2012;104:1293-305. ?

  4. Brower V. Cardiotoxicity debated for anthracyclines and trastuzumab in breast cancer. J Natl Cancer Inst. 2013;105:835-6. ?

  5. Telli ML, Witteles RM. Trastuzumab-related cardiac dysfunction. J Nat l Compr Canc Netw. 2011;9:243-9. ?

  6. Lancellotti P, Nkomo VT, Badano LP, Bergler-Klein J, Bogaert J, Davin L et al: Expert consensus for multi-modality imaging evaluation of cardiovascular complications of radiotherapy in adults: a report from the European Association of Cardiovascular Imaging and the American Society of Echocardiography. Eur Heart J Cardiovasc Imaging 2013; 14: 721-740. ?

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Sobre o autor

Eduardo Lapa

Editor-chefe do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Ecocardiografia pela SBC

1 comentário

  • Parabéns pelo artigo.
    Alguma consideração sobre o uso da onda S do Doppler tecidual mitral septal como marcador precoce de disfunção sistólica nos serviços que não dispõe de strain? Obrigado. Thiago

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