Hemodinâmica Insuficiência Cardíaca

Soube da nova técnica percutânea para o tratamento de cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva?

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A obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo em repouso ou induzida ocorre em aproximadamente 70% dos pacientes com cardiomiopatia hipertrófica (CMH) e pode causar sintomas como dispneia, dor torácica, fibrilação atrial, insuficiência cardíaca e até mesmo morte súbita. A correção da obstrução da VSVE está relacionada a melhora os sintomas e do prognóstico. Para ver uma revisão do mecanismo que causa esta obstrução da VSVE na CMH, veja este post. Neste post iremos falar de uma nova técnica criada para o tratamento de cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva.

Atualmente, dois métodos invasivos são usados para reduzir a obstrução em pacientes refratários ao tratamento clínico: miectomia cirúrgica e ablação septal alcoólica. Embora ambos os procedimentos reduzam o gradiente da VSVE e melhorem os sintomas, é importante ressaltar que na miectomia, há o “inconveniente” da esternotomia e da circulação extracorpórea e na ablação septal, o álcool pode ser injetado incorretamente e a variabilidade anatômica da vascularização do septo hipertrófico pode causar algumas dificuldades.

Em outubro de 2018 foi publicado no JACC um estudo para avaliar a segurança e eficácia de uma nova técnica minimamente invasiva para o tratamento da obstrução da VSVE: a ablação septal intramiocárdica percutânea por radiofrequência.

Para isso, foram incluídos no estudo 15 pacientes consecutivos com cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva sintomáticos (CF II ou III), com idade média de 40,7 anos, sendo 87% homens.

Para realização do procedimento, os pacientes eram colocados em decúbito lateral esquerdo e era realizada anestesia geral. Marca-passo provisório era implantado pela veia jugular interna direita. Uma agulha-eletrodo de radiofrequência era inserida no segmento basal do septo interventricular hipertrófico por abordagem intramiocárdica percutânea, guiada por ecocardiograma transtorácico. Inicia-se a ablação com uma energia de 60 W por 5 min. O segmento ablacionado é visto como uma região hiperecoica ao ecocardiograma. Caso a extensão do miocárdio ablacionado não tenha sido grande o suficiente ao ECO, aumentava-se a energia de ablação para 100 W. O tempo médio de cada aplicação foi de 11 min.

A seguir, a agulha era recuada 10 mm para preparar a próxima ablação. A ablação era feita na porção anterior e posterior do septo. A média do tempo total de ablação foi de 58 min. A ablação era considerada completa quando o gradiente pico da VSVE reduzia para < 30 mmHg ou quando a necrose da área de ablação alcançava 30 a 40 mm do eixo longo do septo interventricular ou 30 a 40 mm de largura no eixo curto. O paciente permanecia 24h em UTI e 5 a 7 dias em enfermaria. O marcapasso era retirado entre os dias 2 e 5.

Todos os pacientes sobreviveram e apresentaram melhora de classe funcional e do tempo de exercício total após 6 meses de seguimento. A ressonância cardíaca confirmou a área de ablação mostrando fibrose e diminuição do septo.

Com relação aos parâmetros hemodinâmicos, a mediana do gradiente da VSVE reduziu de 88 para 11 mmHg no repouso e de 117 para 25 mmHg no esforço, a espessura do septo reduziu de 25 para 14 mm, o volume de regurgitação mitral de 4,3mL para 0,5mL e o pro-BNP de 924pg/mL para 137,5pg/mL, todos com p < 0,001. Nenhum dos pacientes apresentou bloqueio de ramo ou BAVT durante ou após o procedimento.

Com relação às complicações, um paciente apresentou tamponamento pericárdico devido a lesão na veia coronária necessitando intervenção cirúrgica. Nos outros pacientes, foram identificados artéria coronária próxima ao sítio de punção usando angiotomografia de coronária antes do procedimento e pelo ecocardiograma durante o procedimento. O ponto de punção da agulha de ablação é exatamente no ápex, onde o risco de lesão coronariana é menor. O ecocardiograma e a angioTC de coronária aumentaram a segurança do procedimento.

A ablação septal intramiocárdica percutânea por radiofrequência parece ser uma opção terapêutica promissora para pacientes com CMH obstrutiva: segura, eficaz, menos invasiva e sem causar dano ao sistema de condução do coração. Porém novos estudos com maior número de pacientes e com maior tempo de seguimento são necessários para tornar essa técnica rotineira no tratamento destes pacientes.

Opinião do editor (Eduardo Lapa):

Cada vez mais a cardiologia intervencionista vem crescendo no sentido de intervenções minimamente invasivas para correção de cardiopatias estruturais. Exemplos são o implante percutâneo de valva aórtica, o implante de mitraclip para redução de insuficiência mitral, implante percutâneo de prótese mitral, entre vários outros. O atual paper traz uma boa alternativa para tratamento invasivo de CMHO.

DICA: tratamento intervencionista de CMHO visa a redução dos sintomas. Se o paciente é assintomático, segue o jogo. Não precisa fazer nada disso. Se for sintomático, tenta-se antes alternativas como uso de betabloqueadores, por exemplo. Só em casos em que os sintomas são relevantes e refratários ao tratamento medicamentoso é que consideramos intervenção.

 

 

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Sobre o autor

Fábio Augusto Pinton

- Especialista em Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista pelo InCor - FMUSP e pela Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista
- Especialista em Cardiologia pelo InCor - FMUSP e pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC)
- Sócio Titular da Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista (SBHCI)
- Cardiologista Intervencionista do Hospital Sírio-Libanês, da Santa Casa de São Paulo e do Hospital Samaritano de Campinas

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