Coronariopatía

Uma nova opção à aspirina na doença coronária crônica

Escrito por Remo Holanda

Esta publicação também está disponível em: Português

A aspirina é um dos medicamentos mais utilizados em Cardiologia e tem se consagrado por décadas na prevenção secundária de pacientes com doença coronária. Dessa forma, o uso de aspirina na dose de 81-100 mg por dia é recomendado por todas as diretrizes para pacientes com doença aterosclerótica. Entretanto, a aspirina pode levar a intolerância gastrointestinal em alguns pacientes, além de poder resultar em reações alérgicas. Mas seria possível encontrarmos um medicamento substituto como nova opção à aspirina?

Esta pergunta motivou o estudo OPTION, publicado por Wu e cols. no periódico Circulation e apresentado no último Congresso da American Heart Association. Neste estudo, os pesquisadores incluíram 4551 pacientes na China submetidos a uma intervenção coronária percutânea (ICP) devido à doença coronária crônica (43,6% dos pacientes) ou angina instável (56,4%). Os pacientes foram randomizados para dupla anti-agregação tradicional com aspirina 100 mg  + clopidogrel 75 mg por 12 meses versus dupla antiagregação com clopidogrel + indobufeno, um inibidor seletivo e reversível da ciclo-oxigenase 1 (COX-1), na dose de 100 mg 2 vezes ao dia. O desfecho primário do estudo foi um composto de morte cardiovascular (CV), infarto, AVC isquêmico, trombose de stent ou sangramento BARC (Bleeding Academic Research Consortium)  2, 3 ou 5. Ao final de 12 meses de seguimento, o a dupla antiagregação com indobufeno foi superior à dupla antiagregação plaquetária tradicional (hazard ratio [HR] 0,73; intervalo de confiança [IC] 95% 0,56-0,94; P = 0,015). Essa diferença se deu às custas de menor ocorrência de sangramento BARC 2-5 com indobufeno (HR 0,63; IC 95% 0,46-0,85; P = 0,002), porém sem diferença entre os grupos na ocorrência de sangramento importante, ou seja, BARC 3 ou 5 (HR 1,05; IC 95% 0,63-1,77). Também não houve diferença entre os grupos na ocorrência dos eventos isquêmicos (HR 1,08; IC 95% 0,67-1,75).

E agora? Será que temos nova opção à aspirina? Bem, vamos olhar com calma alguns detalhes desses resultados. Em primeiro lugar, quando desejamos testar um novo tratamento como alternativa a um tratamento tradicional em virtude de o tratamento alternativo ser mais barato, conveniente ou mais bem tolerado, temos de recorrer ao chamado estudo de não-inferioridade. Nesse tipo de estudo, temos de analisar se, na pior das hipóteses, o novo tratamento não perde para o tradicional por uma diferença clinicamente razoável. O estudo OPTION até foi desenhado assim, porém os investigadores utilizaram como desfecho primário um combinado de eventos isquêmicos e hemorrágicos, quando na verdade somente os eventos isquêmicos deveriam ter entrado neste desfecho. OK, mas o indobufeno foi na verdade superior à aspirina nos sangramentos, certo? Aqui vem outro detalhe importante. Essa superioridade se deu às custas de sangramento BARC 2, que por definição compreendem qualquer sangramento que resulte em contato extra com o serviço de saúde ou mudança de terapia guiada por um médico. Ou seja, se o paciente apresentar um sangramento gengival que motive o contato com o médico e motive a suspensão de uma dose do medicamento, isso já conta como BARC 2 (Quer aprender mais sobre como interpretar um estudo? Cheque nosso Curso de Medicina Baseada em Evidência: https://lp2.cardiopapers.com.br/mbe-matriculas-perpetuo-vitrine/)

Apesar de tais limitações, os investigadores do estudo OPTION devem ser congratulados pelo importante estudo e por desafiar um conceito bastante arraigado na cardiologia. Moral da história: o indobufeno pode ser uma interessante nova opção à aspirina, sobretudo naqueles pacientes com histórico de alergia  (onde até então não havia alternativa a não ser promover a dessensibilização; para mais detalhes sobre isso, confira em https://d3gjbiomfzjjxw.cloudfront.net/alergia_aas/). Futuros estudos devem esclarecer melhor se este medicamento é capaz de fato de preservar o benefício antitrombótico da boa e velha aspirina. Por enquanto, ainda não temos a medicação disponível no Brasil.

 

 

REFERÊNCIAS

Wu H, Xu L, Zhao X, Zhang H, Cheng K, Wang X, Chen M, Li G, Huang J, Lan J, Wei G, Zhang C, Wang Y, Qian J, Ge J. Indobufen or Aspirin on Top of Clopidogrel after Coronary Drug-eluting Stent Implantation (OPTION): a Randomized, Open-label, Endpoint-blinded, Non-inferiority Trial. Circulation. 2022 Nov 6. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.122.062762. Epub ahead of print. (https://www.ahajournals.org/doi/abs/10.1161/CIRCULATIONAHA.122.062762?url_ver=Z39.88-2003&rfr_id=ori:rid:crossref.org&rfr_dat=cr_pub%20%200pubmed)

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