Coronariopatia Manchetes da Semana

Colchicina é a medicação cardiovascular do momento?

Escrito por Humberto Graner

Esta publicação também está disponível em: Português

Você está ligado no Cardiopapers e já notou que falamos muito de colchicina para doença cardiovascular este ano! Tiveram até primeiras recomendações para seu uso nas diretrizes de coronariopatia crônica da AHA/ACC. Na última semana, ninguém menos que Valentin Fuster e Paul Ridker publicaram uma revisão muito boa sobre o assunto! A gente resume aqui pra você:

♦ A inflamação sistêmica residual, determinada pela PCR ultrassensível, é o determinante mais poderoso para eventos cardiovasculares (CV) recorrentes, morte CV e mortalidade por todas as causas do que o colesterol LDL. Quando a PCR é ≥2 mg/L, o valor preditivo de eventos CV é independente de LDL-C (mesmo em níveis baixos).

♦ Os ensaios randomizados recentes com o inibidor de interleucina-1 canakinumab e do inibidor de polimerização de microtúbulos colchicina em baixa dose fornecem evidências de que inibir a inflamação reduz com segurança as taxas de eventos CV entre pacientes tratados com estatinas. E a magnitude deste efeito foi semelhante e, em alguns casos, até maior do que do que a dos inibidores de PCSK9, ezetimibe e outros agentes adjuvantes redutores de lipídios.

♦ O benefício clínico da inibição da inflamação direcionada para pacientes com doença cardiovascular é particularmente verdadeiro para a colchicina em baixa dose (0,5 mg uma vez ao dia), que no estudo LoDoCo2 (Low Dose Colchicine Trial 2) reduziu os eventos de DCVA em 31% nos pacientes com DAC estável. O benefício na doença coronária estável foi independente da história de infarto agudo do miocárdio anterior, e número necessário para tratar durante uma duração média de acompanhamento de 28,6 meses foi de 35, consistente com os benefícios da aspirina, estatinas e terapia anti-hipertensiva na prevenção secundária.

♦ A colchicina em baixa dose a longo prazo na fase estável após infarto do miocárdio ou intervenção coronária percutânea (ICP) também oferece benefício clínico significativo. Com um tempo mediano para o início do tratamento de 14 dias após a hospitalização e acompanhamento médio de 23 meses, no estudo COLCOT (Colchicine Cardiovascular Outcomes Trial), os pacientes tratados com colchicina 0,5 mg diariamente tiveram uma redução de 23% menor na incidência do composto primário. O benefício foi mais significativo na redução de AVC (26%) e na angina que requer revascularização (50%). Como no LoDoCo2, a mortalidade por todas as causas em COLCOT foi neutra, uma constatação também verdadeira para ensaios contemporâneos de pacientes em estatinas, incluindo inibição de PCSK9, ezetimibe e ácido bempedoico.

♦ Em contraste com as observações acima, em três pequenos ensaios de colchicina utilizada como tratamento imediato para síndromes coronárias agudas, não houve redução nas taxas de eventos. Grandes ensaios em andamento são projetados para determinar o benefício em MI com ICP e síndrome coronária aguda com PCR ≥2 mg/L.

♦ A colchicina é excretada pelos rins e deve ser evitada naqueles com doença renal crônica clinicamente significativa, bem como na doença hepática. Em contraste com os participantes do LoDoCo2 com função renal preservada, onde a colchicina em baixa dose foi altamente eficaz, a colchicina não reduziu os eventos vasculares naqueles com taxa de filtração glomerular estimada <60 mL/min/1,73 m2, um nível em que pode ser nefrotóxica. A exposição crônica à colchicina 0,5 mg diariamente não alterou adversamente a função renal.

♦ Em várias metanálises, não houve interações medicamentosas significativas entre colchicina e aspirina, estatinas ou outras terapias médicas direcionadas pelas diretrizes comumente usadas para tratar a doença aterosclerótica. A segurança da colchicina 0,5 mg em >10.000 pacientes tratados com estatinas nos ensaios LoDoCo2 e COLCOT é tranquilizadora, considerando doses altas muitas vezes utilizadas para tratar outras doenças inflamatórias agudas. Não há relatos de miostite quando a colchicina em baixa dose é usada na ausência de doença renal ou hepática e/ou na ausência de inibidores fortes de CYP3A4 ou P-glicoproteína. É aconselhável interromper temporariamente a colchicina por uma semana ou duas se algum desses medicamentos for iniciado como terapia de curto prazo.

♦ Alinhados com a mais recente diretriz de doença coronária crônica, os cardiologistas norte-americanos já estão sendo orientados a considerar 0,5 mg de colchicina para DAC estável. As diretrizes europeias de 2021 já recomendam que a colchicina 0,5 mg diariamente seja considerada para fins de prevenção secundária, particularmente em indivíduos com fatores de risco não controlados ou eventos recorrentes, apesar da terapia médica otimizada. No Brasil, ainda não temos um documento formal que apóie o uso (ainda)!

Quer saber mais?
Referência

Nelson K, Fuster V, Ridker PM.Low-Dose Colchicine for Secondary Prevention of Coronary Artery Disease: JACC Review Topic of the Week. J Am Coll Cardiol 2023;82:648-660.

 

 

Banner Atheneu

Banner Atheneu

Banner Atheneu

Banner ECG

Deixe um comentário

Sobre o autor

Humberto Graner

Co-Editor do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Medicina Intensiva
Professor das Faculdades de Medicina da UFG e UniEvangélica (Goiás)
Doutor em Ciências pelo InCor-HCFMUSP
Fellowship em Coronariopatias Agudas pelo InCor-HCFMUSP
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein - Unidade Goiânia (GO)
Pesquisador da ARO (Academic Research Organization) - Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo (SP)

Deixe um comentário

Seja parceiro do Cardiopapers. Conheça os pacotes de anúncios e divulgações em nosso MídiaKit.

Anunciar no site