Manchetes da Semana Prevenção

Quais os Riscos à Saúde dos Cigarros Eletrônicos e Vaping?

Escrito por Humberto Graner

Esta publicação também está disponível em: Português

O tabagismo é a principal causa de morte prevenível no mundo. Os cigarros eletrônicos ou vaporizadores (vaping ou “vape”), também conhecidos como sistemas eletrônicos de entrega de nicotina (ENDS), cresceu exponencialmente na última década. Eles surgiram na China no início dos anos 2000 e chegaram aos Estados Unidos e no Brasil no final da década, tornando-se especialmente populares entre jovens e adultos jovens.

Por causa de seus ingredientes mais simples e da ausência de combustão, há uma percepção de que os cigarros eletrônicos são alternativas mais seguras que os cigarros tradicionais. Esses dispositivos usam calor ou atomização de um líquido – geralmente uma mistura de umectante, aromatizante e nicotina, às vezes até THC ou outras substâncias – para gerar vapor sem produzir fumaça.

Em 2019, uma pesquisa da American Heart Association revelou que mais de um quarto dos estudantes do ensino médio dos EUA disseram que usavam cigarros eletrônicos, em comparação com 5,8% que fumavam aqueles convencionais. Entre os adultos, a maioria dos usuários são fumantes ou ex-fumantes.

Por isso, a própria American Heart Association coordenou uma revisão profunda sobre o tema, e publicou seu posicionamento sobre cigarros eletrônicos e ENDS.

Todos os cigarros eletrônicos são atualmente regulamentados como produtos de tabaco, e como aponta o documento da AHA, eles não passam pelos estudos de segurança animal e humana pré-comercializados exigidos de um medicamento ou dispositivo médico. Desde 2010, os ENDS foram regulamentados pelo FDA desta maneira.

É muito atual e oportuno revisar as implicações de curto e longo prazo dos cigarros eletrônicos e produtos de vaping na saúde cardiopulmonar. Evidências clínicas iniciais sugerem vários efeitos fisiológicos agudos, particularmente aqueles que contêm nicotina.

Figura. Resumo dos mecanismos fisopatológicos pelos quais os produtos de vaporização podem afetar a saúde cardiovascular. (Circulation 2023)

Grandes estudos de pesquisa se concentraram em adultos mais jovens, que têm uma baixa incidência de infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral. Por isso, nossa compreensão atual dos efeitos cardiovasculares deletérios é derivada em grande parte de estudos de curto prazo de usuários de ENDS. Evidências indicam que há alterações agudas em várias medidas hemodinâmicas, incluindo aumentos da pressão arterial e da frequência cardíaca, sobretudo aqueles contendo nicotina.

No entanto, a diversidade e constante mudança nos componentes dos ENDS tornam ainda mais difícil tirar conclusões sobre a segurança. O vapor gerado a partir de diferentes tipos de dispositivos e produtos resulta em efeitos distintos em relação à toxicidade das células epiteliais pulmonares e endoteliais. As diferenças toxicológicas se devem às características dos produtos, como níveis variados de nicotina e aditivos aromatizantes.

Quer a nicotina esteja presente ou não, “muitos constituintes do produto ENDS, incluindo aditivos aromatizantes, transportadores higroscópicos como propilenoglicol e glicerol, e metais (da serpentina de aquecimento) demonstraram induzir toxicidade cardiopulmonar em animais e estudos in vitro“, observam os autores.

O mais importante é enfatizar que, apesar do apelo da indústria e da falsa percepção de segurança, os cigarros eletrônicos podem apresentar riscos significativos à saúde, e pesquisas contínuas são necessárias para entender completamente essas implicações.

O documento enfatiza a necessidade crítica de pesquisa adicionais, especificamente:

  • Pesquisas futuras devem se concentrar em obter conhecimento sobre os potenciais efeitos graves e de longo prazo dos cigarros eletrônicos no coração, vasos sanguíneos e pulmões.
  • São necessários mais estudos que incluam pacientes com doença cardiopulmonar preexistente, como doença arterial coronariana ou doença pulmonar obstrutiva crônica, para avaliar e comparar os resultados entre os usuários de cigarros eletrônicos em comparação com os fumantes tradicionais e aqueles que usam cigarros eletrônicos junto com os tradicionais cigarros (referidos como usuários duplos), versus não fumantes.
  • Precisamos ampliar o entendimento dos efeitos dos diferentes ingredientes químicos comuns nos cigarros eletrônicos  na saúde pulmonar e cardíaca.
  • Como o impacto de longo prazo dos cigarros eletrônicos na saúde pode levar décadas para surgir, é preciso se valer de modelos biológicos e moleculares nesse ínterim para ajudar a determinar as implicações destes.

Ou seja, como ainda não temos informações suficientes sobre seus efeitos na saúde a longo prazo, por enquanto devemos confiar em estudos de curto prazo, muitos dos quais sinalizam para efeitos agudos cardiovasculares, pulmonares e cerebrovasculares.

Neste sentido, a AHA recomenda que os profissionais de saúde realizem triagem para o uso de todos os produtos de tabaco e aconselhem a cessação destes. Os jovens devem ser rastreados quanto ao uso de novos produtos de tabaco e abuso de substâncias, e aconselhados sobre os perigos destes. Programas de prevenção ao uso de substâncias por jovens devem visar a redução do uso de cigarros eletrônicos. Além disso, há uma necessidade de desenvolver mensagens de saúde pública que transmitam com precisão os dados científicos sobre o potencial dano dos cigarros eletrônicos.

Referência

Rose JJ, Krishnan-Sarin S, Exil VJ, et al. Cardiopulmonary Impact of Electronic Cigarettes and Vaping Products: A Scientific Statement From the American Heart Association. Circulation. 2023 Jul 17. doi: 10.1161/CIR.0000000000001160. Epub ahead of print.

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Sobre o autor

Humberto Graner

Co-Editor do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Medicina Intensiva
Professor das Faculdades de Medicina da UFG e UniEvangélica (Goiás)
Doutor em Ciências pelo InCor-HCFMUSP
Fellowship em Coronariopatias Agudas pelo InCor-HCFMUSP
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein - Unidade Goiânia (GO)
Pesquisador da ARO (Academic Research Organization) - Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo (SP)

1 comentário

  • Valeu prof Humberto! Apesar de não termos muitos dados ainda, o artigo já nos situa para uma posição mais amparada frente aos pacientes.

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