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Afinal de contas, devemos prescrever ômega-3?

Escrito por Giordano Bruno

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O estudo REDUCE-IT publicado na NEJM demonstrou de maneira significativa que pacientes de alto risco cardiovascular (diabetes associada a outro fator de risco, ou doença cardiovascular estabelecida), já tratados com estatina, que o uso do EPA (um dos componentes dos ômega-3) reduziu eventos cardiovasculares (end-point composto e isoladamente), reduzindo também morte cardiovascular de maneira significativa.

Estes pacientes, já com LDL entre 40 e 100, mas com triglicerídeos que iam até 500, observaram um impacto quase equivalente ao uso de estatina (redução de 22% do end-point composto, com NNT de 21; e redução de 17% da morte CV com NNT de 111).

Esse resultado gerou muito impacto no meio científico, uma vez que a maioria dos estudos e metanálises com ômega-3 não demonstraram benefício, incluindo um estudo publicado na mesma edição da NEJM (estudo VITAL). Além disso, o que mais surpreendeu os pesquisadores foi que o impacto estatístico foi desproporcional á redução observada nos TGs do grupo que usou a droga.

E agora ? em quem acreditar ?

Verdades e Mentiras sobre ômega-3

  • Todos os inquéritos epidemiológicos com populações que consomem elevadas quantidades de ômega-3 (sobretudo o marinho), na dieta, mostram redução importante do risco de aterosclerose clínica.
  • Em termos de plausibilidade biológica, o ômega-3 já demonstrou efeito benéfico em relação aos triglicerídeos, partículas LDL, HDL, resistência insulínica, pressão arterial, frequência cardíaca, função endotelial, inflamação vascular, relaxamento cardíaco e aproveitamento energético do músculo cardíaco, a ponto de ser recomendado em relação a esse último para pacientes com insuficiência cardíaca crônica (indicação IIa)
  • Até agora, todas as tentativas de “artificialmente” administrar por suplementos ômega-3, principalmente em população de mais baixo risco falharam em demonstrar benefício (lembrar que o estudo já utiliza pacientes “doentes”, já tratados, e com uma fração do ômega-3 específica, o EPA). Entretanto, não foi feito inquérito alimentar para se certificar se os pacientes podiam estar usando na dieta quantidades baixas de ômega-3, e o grupo placebo usou óleo mineral (que pode ter afetado a absorção de alguns nutrientes)
  • O maior desafio quando falamos em dieta rica em ômega-3 é descobrir o que é benefício real do ômega-3, e o que é benefício de muitos nutrientes também presentes nos alimentos (poliinsaturados, fibras, esteróis vegetais, polifenois, selênio). Além disso, adeptos ao uso de ômega-3 podem ter hábitos mais saudáveis,  mesma coisa pode ser vista quando comparamos a dieta mediterrânea, com o estilo de vida mediterrâneo, que parece ser o mais vantajoso.

Grupos com maior vantagem para suplementar ômega-3

  • Portadores de síndrome metabólica: elevada resistência insulínica, HDL baixo, Tg alto, obesidade, HAS
  • Portadores de insuficiência cardíaca
  • Pacientes não interessados em aderir ao suplemento dietético alimentar (que seria o ideal)

Então, em resumo, vamos considerar o uso de ômega-3 (suplemento em cápsulas):

  • Em portadores de IC crônica, em classe funcional II-III
  • Portadores de hipertrigliceridemia, de alto risco: diabéticos ou com doença aterosclerótica, especialmente se o paciente não tem intenção de aderir a dieta rica em ômega-3 (peixes principalmente pela proporção de EPA/DHA). Lembrando que idealmente, nesses casos o certo seria suplementar pelo menos 250mg de EPA/DHA. Além disso, ainda não temos disponível no Brasil o EPA isolado que foi usado no estudo REDUCE-IT.

Nota do editor (Eduardo Lapa)

Após vários estudos negativos avaliando o uso de ômega-3 na prevenção de eventos cardiovasculares, eis que chega o REDUCE-IT e não apenas mostra dados positivos, mas inclusive redução de mortalidade. Os motivos que poderiam explicar essa diferença são levantados na discussão do artigo mas o fato é que os próprios autores não sabem dizer o que levou a tamanha redução de eventos. Nesse contexto, acho que o último parágrafo do editorial que acompanha o artigo é sensato:

“In conclusion, after a parade of failed cardiovascular outcome trials of fish oils, REDUCE-IT has shown a substantial benefit with respect to major adverse cardiovascular events. More data are needed to confirm these effects and to inform an understanding of the mechanism of action, the uniqueness of the compound tested, and the potential influence of mineral oil as the comparator. However, the finding that the risks of several cardiovascular outcomes were significantly and consistently lower with icosapent ethyl than with placebo make us hopeful that the use of icosapent ethyl can substantially improve cardiovascular health in patients with statin-controlled LDL cholesterol levels who have elevated triglyceride levels.”

Referências

Cardiovascular Risk Reduction with Icosapent Ethyl for Hypertriglyceridemia. REDUCE-IT Investigators. NEJM nov/2018

FISHing for the Miracle of Eicosapentaenoic Acid. Editorial NEJM Nov/2018

Effects of n−3 Fatty Acid Supplements in Diabetes Mellitus – The ASCEND Study Collaborative Group. NEJM Ago/2018

 

 

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Sobre o autor

Giordano Bruno

Médico Cardiologista e Ecocardiografista formado pela UFPE
Supervisor da residência em cardiologia do Hospital Agamenon Magalhães - SES/PE
Coordenador dos protocolos da cardiologia do Realcor / Real Hospital Português/PE

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