Insuficiência Cardíaca

Reclassificando o estágio da insuficiência cardíaca com biomarcadores

Escrito por Humberto Graner

Esta publicação também está disponível em: Português

A utilização de biomarcadores cardíacos (NT-pro-BNP e troponina) para estadiar a insuficiência cardíaca foi reclassificou mais de 20% dos indivíduos do Estágio A (“em risco de IC”) para o Estágio B. Especialmente na presença de doença cardíaca estrutural, esses biomarcadores elevados na IC estágio B esteve associada a um risco aumentado de IC sintomática e morte por todas as causas.

Estes foram os principais achados de um estudo publicado recentemente no JACC Heart Failure. Os pesquisadores avaliaram 5.324 idosos (idade média de 75,8 anos; 58,6% mulheres) inscritos no estudo ARIC (Atherosclerosis Risk in Communities) que não apresentavam IC em determinada visita de seguimento (2011-2013). No geral, 51,6% tinham níveis elevados de NT-proBNP e 33,3% tinham níveis elevados de troponina T de alta sensibilidade. Sob a nova classificação, aproximadamente um em cada cinco indivíduos (21,1%) com biomarcadores cardíacos elevados sem anormalidades ecocardiográficas poderiam ser reclassificados do estágio A para o estágio B.

E qual seria o impacto disso?

E comparação com aqueles com estágio A, aqueles com estágio B tiveram risco aumentado para incidência de IC (HR 3,89; IC 95% 2,71-5,58), IC com fração de ejeção reduzida (ICFEr; HR: 3,08; IC 95% 1,59-5,95), IC com fração de ejeção preservada (ICFEp; HR 2,10; IC 95% 1,33-3,30), e morte por todas as causas (HR 1,95; IC 95% 1,54-2,47) durante o período de seguimento.

Foram feitas ainda análises mais detalhadas dos pacientes reclassificados em estágio B quando comparados com estágio A:

  • apenas biomarcadores alterados (n=1.123) = maior risco de incidência de IC (HR 2,07; IC95% 1,37-3,12) e morte por todas as causas (HR 2,06; IC 95% 1,49-2,84);
  • apenas ecocardiograma alterado (n=852) = maior risco de incidência de IC (HR 2,24; 95% CI 1,45-3,47), sem impacto em mortalidade;
  • biomarcadores mais ecocardiograma alterados (n=2.351) = maior risco para incidência de IC (HR 5,44; 95% CI 3,77-7,85), ICFEr (HR 5,20; 95% CI 2,64-10,26), ICFEp (HR 3,08; 95 % CI 1,91-4,94) e morte por todas as causas (HR 2,76; 95% CI 2,06-3,69).

Análises secundárias mostraram que NT-proBNP e troponina T foram associados a padrões semelhantes de risco aumentado. E ainda, os indivíduos com elevações de biomarcadores e anormalidades ao eco eram mais propensos a ter dilatação das câmaras cardíacas, FEVE reduzida, disfunção da mobilidade segmentar, e disfunção diastólica.

Comentários:

Agora que temos novas evidências que possam apoiar a medição de biomarcadores cardíacos em pacientes sob risco de insuficiência cardíaca, quais são as possíveis implicações práticas? Há muito tempo se discute o papel da prevenção primária da insuficiência cardíaca, incluindo modificação de fatores de risco como hipertensão, diabetes, obesidade, etc. Assim, medidas como aferir a pressão arterial, obter um painel lipídico ou hemoglobina glicada pode parecer mais “natural” para os médicos. Assim, talvez esses pacientes em Estágio A também tenham que ter uma medição de biomarcador cardíaco (BNP ou troponina) como parte dos cuidados de rotina. Aqueles com elevações de biomarcadores podem se beneficiar não apenas do manejo dos fatores de risco, mas também de uma avaliação adicional, incluindo ecocardiografia, por exemplo. Dados anteriores do estudo STOP-HF (St Vincent’s Screening to Prevent Heart Failure) sugerem que pacientes com pré-insuficiência cardíaca com elevação de biomarcadores cardíacos, quando encaminhados a um cardiologista para avaliação e tratamento, melhoraram os resultados clínicos.

Esses dados também corroboram que podemos avançar na consolidação da definição de estágios pré-IC, inclusive desenhando ensaios clínicos com critérios mais apropriados e reprodutíveis para identificar esta população. Podemos progredir ainda mais neste campo, por exemplo, buscando respostas sobre como poderíamos interromper a progressão da doença, reduzir a incidência de IC ou mesmo morte nesses pacientes Estágio B com biomarcadores elevados.

A definição universal de infarto do miocárdio foi publicada em 2000 e atualizada 3 vezes desde então. É provável que a definição universal de IC também evolua no futuro. Mas, de maneira pragmática, ao identificar pacientes em com fatores de risco e biomarcadores elevados (reclassificando-os de Estágio A para B) pode representar uma nova oportunidade para melhorar os desfechos clínicos desses pacientes.

  • Você sabe definir e classificar a insuficiência cardíaca? Veja aqui!

Referência:

Jia X.Rifai M.A.Ndumele C.E.et al. “Reclassification of pre-heart failure stages using cardiac biomarkers: the ARIC study”. J Am Coll Cardiol HF . 2023;11:440-450.

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Sobre o autor

Humberto Graner

Co-Editor do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Medicina Intensiva
Professor das Faculdades de Medicina da UFG e UniEvangélica (Goiás)
Doutor em Ciências pelo InCor-HCFMUSP
Fellowship em Coronariopatias Agudas pelo InCor-HCFMUSP
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein - Unidade Goiânia (GO)
Pesquisador da ARO (Academic Research Organization) - Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo (SP)

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