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Intoxicação Digitálica: o que você precisa saber?

Escrito por Pedro Veronese

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Desde a sua descrição, há mais de 200 anos, os digitálicos vêm sendo utilizados pelas suas propriedades de cronotropismo negativo e inotropismo positivo em pacientes com arritmias atriais e/ou insuficiência cardíaca. Apesar do uso desses fármacos vir caindo gradativamente, a intoxicação por eles ainda é vista com certa frequência nos serviços de emergência.

No Brasil, as apresentações mais habitualmente encontradas são a digoxina 0,25 mg de uso oral (doses 0,125 mg a 0,25 mg/dia) e o deslanosídeo 0,4 mg de uso intravenoso (doses 0,8 mg a 1,6 mg/dia). Porém, existem várias outras substâncias, muitas das quais “naturais”, sendo vendidas de forma indiscriminada para emagrecer (plantas, sementes etc.), que atuam como glicosídeos cardíacos.

Os achados clínicos da intoxicação por digitálicos incluem alterações neurológicas (ex. confusão, xantopsia, fraqueza), cardíacas (ex. taqui ou bradiarritmias) e gastrointestinais (ex. anorexia, náusea, vômito, dor abdominal). A intoxicação digitálica deve ser suspeitada quando há alterações clínicas e eletrocardiográficas características. Níveis isolados de digoxinemia não fazem diagnóstico de intoxicação. Os níveis terapêuticos são estreitos e variam de 0,5 a 0,8 ng/mL (0,65 a 1,0 nmol/L). O uso concomitante de verapamil, amiodarona, entre outros medicamentos, pode aumentar os níveis séricos do digital.

Nas intoxicações agudas a hipercalemia é a regra devido ao bloqueio da bomba Na/K ATPase. Nas intoxicações crônicas, devido ao uso concomitante de diuréticos de alça, a hipocalemia é mais frequente.

As alterações cardíacas são as mais temíveis e, virtualmente, qualquer arritmia pode estar presente. As extrassístoles ventriculares são as arritmias mais frequentemente encontradas na intoxicação digitálica. Mas também podem ser encontradas: bradicardias, taquicardia atrial com bloqueio atrioventricular variável (fortemente sugestiva de intoxicação digitálica), bigeminismo ventricular, ritmo juncional, bloqueios atrioventriculares, taquicardia ventricular e fibrilação ventricular. A TV bidirecional é rara e não é patognomônica desta condição, pode ser encontrada em outras doenças como por exemplo a taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica.

O tratamento para esta intoxicação consiste em suporte clínico e administração do anticorpo específico para digoxina (Fab fragments) nos casos graves (ex. arritmias com instabilidade hemodinâmica ou hipercalemia – K > 5 mEq/L ou evidências de disfunção orgânica por hipoperfusão), não disponível facilmente na maioria dos serviços de emergência do país. Hidratação, atropina e passagem de marca-passo podem ser utilizados na emergência para restaurar pressão arterial e frequência cardíaca. Corrija os distúrbios eletrolíticos, principalmente potássio e magnésio. Lembre-se que digital não é dialisável. A fenitoína (15 a 20 mg/Kg – vel. máxima de infusão 50 mg/min) pode ser utilizada no tratamento da TV bidirecional na intoxicação digitálica Fig. 1.


Referências:

1.    Ma G, Brady WJ, Pollack M, Chan TC. Electrocardiographic manifestations: digitalis toxicity.J Emerg Med. 2001 Feb;20(2):145-52. Review.

2.    Ary L Goldberger et all. Cardiac Arrhythmias Due to Digoxin Toxicity. UpToDate 2019.

3.    French JH, Thomas RG, Siskind AP, Brodsky M, Iseri LT. Magnesium therapy in massive digoxin intoxication. Ann Emerg Med. 1984 Jul;13(7):562-6.

4.    Vinod Patel et all. Digitalis Toxicity. Medscape. Updated: Jan 04, 2017.






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Sobre o autor

Pedro Veronese

Médico Especialista em Clínica Médica pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Cardiologista, Arritmologista e Eletrofisiologista pelo InCor-HCFMUSP.
Médico Especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC.
Médico Especialista em Arritmia Clínica e Eletrofisiologia pela Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas - SOBRAC.
Médico do Centro de Arritmias Cardíacas do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
Doutor em Cardiologia pelo InCor - HCFMUSP.
Preceptor da Residência de Clínica Médica do Hospital Estadual de Sapopemba e Hospital Estadual Vila Alpina.
Médico Chefe de Plantão do Pronto Socorro Central da Santa Casa de São Paulo.
Professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Professor da Faculdade de Medicina UNINOVE.

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