Valvopatias

Novidades sobre DOAC em pacientes com prótese valvar mecânica

Escrito por Humberto Graner

Esta publicação também está disponível em: Português

Você já sabe que pacientes portadores de válvulas cardíacas mecânicas exigem anticoagulação contínua com antagonistas de vitamina K, a fim de evitar trombose e tromboembolismo associados à prótese. A varfarina está sujeita a muitas interações medicamentosas e necessidade de monitoramento contínuo da faixa terapêutica, e isso impacta na escolha do cardiologista e do próprio paciente em detrimento das biopróteses (menos duráveis). Os anticoagulantes orais diretos ainda não demonstraram eficácia na prevenção de eventos trombóticos em pacientes com válvulas mecânicas. Um estudo anterior com dabigatrana em pacientes com prótese mecânica aórtica ou mitral foi interrompido precocemente devido a taxas mais altas de eventos tromboembólicos e hemorrágicos em pacientes que utilizavam o DOAC em comparação com a varfarina. Por isso, ainda não se recomenda DOAC em portadores de prótese mecânica.

Mas e se a válvula mecânica for menos trombogênica?

A prótese mecânica On-X® foi desenhada e construída com material cujas características podem torná-la menos suscetível à trombose do que outras válvulas cardíacas mecânicas. Com base nos resultados do PROACT (Prospective Randomized On-X Anticoagulation Clinical Trial), a On-X pode exigir menor intensidade de anticoagulação com varfarina, por exemplo, com RNI entre 1,5 e 2,0.

Então pacientes com esta prótese poderiam receber DOAC?

Esta foi a pergunta que o projeto PROACT-Xa procurou responder.

Este estudo foi um ensaio clínico randomizado, multicêntrico, aberto e de não-inferioridade que comparou a eficácia e segurança do apixabana com a varfarina em pacientes com uma válvula aórtica mecânica On-X implantada há pelo menos 3 meses. Os pacientes foram randomizados em uma proporção de 1:1 para receber apixabana (5 mg duas vezes ao dia) ou varfarina (alvo de INR entre 2,0 e 3,0). O desfecho primário foi um composto de trombose valvar ou tromboembolismo relacionado à válvula. Os desfechos secundários incluíram eventos hemorrágicos maiores e menores. A duração média do acompanhamento foi de 17 meses.

E quais foram os principais resultados?

Entre maio de 2020 e setembro de 2022, 863 participantes foram randomizados para receber apixabana ou varfarina. Quase todos os pacientes estavam em uso concomitante de aspirina (94%). O estudo foi interrompido precocemente devido a um excesso de eventos tromboembólicos no grupo da apixabana.

  • O número de eventos tromboembólicos foi maior no grupo da apixabana (16 eventos) do que no grupo da varfarina (5 eventos).
  • A taxa de eventos do desfecho primário foi de 4,2% por ano-paciente no grupo da apixabana e 1,3% por ano-paciente no grupo da varfarina. A diferença entre os grupos (2,9%) não atingiu a margem para não inferioridade.
  • Não houve diferenças significativas nas taxas de sangramento maior entre os grupos tratados com apixabana e varfarina. (1,3% por ano-paciente no grupo da apixabana versus 1,4% por ano-paciente no grupo da varfarina). O risco relativo para sangramento maior com a apixabana em comparação com a varfarina foi de 0,93 (IC95% 0,34 a 2,56).
DOAC falha mais uma vez em proteger pacientes com válvula mecânica…

Os autores do estudo (que contam com o Prof. Renato Lopes) destacam que o estudo não atingiu a não-inferioridade da apixabana em relação à varfarina na prevenção de eventos trombóticos relacionados à válvula mecânica. Foram incluídos apenas pacientes com próteses aórticas, pois têm maior velocidade de fluxo e, portanto, são menos propensas a complicações trombóticas do que as válvulas mitrais. Ainda assim, mesmo nestes pacientes, apixabana não foi tão eficaz quanto varfarina.

O estudo foi bem conduzido, mesmo durante a pandemia de Covid-19, graças a características pragmáticas de design. Os centros de pesquisa foram selecionados com base no volume de implantes e na rápida identificação de pacientes elegíveis com válvula aórtica mecânica On-X. Além disso, destacam-se os critérios simplificados de elegibilidade, recrutamento e consentimento remoto, além do envio dos medicamentos apixabana e varfarina diretamente às casas dos participantes.

Como possíveis limitações, destaca-se que o estudo foi aberto (open-label), o que significa que tanto os pacientes quanto os pesquisadores sabiam quem estava tomando apixabana ou varfarina. Para minimizar o viés de aferição, foram utilizados desfechos clinicamente relevantes, e todos os eventos foram centralmente adjudicados de forma cega. Os autores também mencionam que não foram capazes de identificar uma explicação clara para o excesso de eventos tromboembólicos no grupo da apixabana, e estes mecanismos permanecem não compreendidos.

Ou seja, válvulas mecânicas ainda exigem anticoagulação com antagonistas de vitamina K (varfarina). 

Referência:

Wang TY, Svensson LG, Wen J, et al, for PROACT Xa Investigators. Apixaban or Warfarin in Patients with an On-X Mechanical Aortic Valve. NEJM Evidence. Published May 6, 2023. DOI: 10.1056/EVIDoa2300067

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Sobre o autor

Humberto Graner

Co-Editor do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Medicina Intensiva
Professor das Faculdades de Medicina da UFG e UniEvangélica (Goiás)
Doutor em Ciências pelo InCor-HCFMUSP
Fellowship em Coronariopatias Agudas pelo InCor-HCFMUSP
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein - Unidade Goiânia (GO)
Pesquisador da ARO (Academic Research Organization) - Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo (SP)

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