Miscelânia

Jejum de Dopamina: já ouviu falar?

Escrito por Humberto Graner

Esta publicação também está disponível em: Português

O conceito de “jejum de dopamina” propõe uma pausa temporária em comportamentos potencialmente viciantes, como o uso excessivo de mídias sociais, videogames, jogos de azar, compras, alimentação inadequada, e o consumo de drogas ou bebidas alcoólicas.

A ideia é que, ao interromper essas atividades, é possível redefinir o circuito de recompensa do cérebro, diminuindo assim os maus hábitos e o desejo excessivo. Conhecido também como “desintoxicação de dopamina“, este método sugere que o controle sobre a liberação de dopamina, o neurotransmissor associado ao bem-estar, pode ser uma estratégia eficaz para combater vícios.

Uma das maiores defensoras deste método é a Dra. Anna Lembke, médica e professora de psiquiatria na Stanford University School of Medicine e chefe da Stanford Addiction Medicine Dual Diagnosis Clinic, autora do livro “Nação Dopamina”. Por outro lado, alguns especialistas consideram-na uma abordagem simplista (e até perigosa). Vamos entender um pouco mais sobre este “jejum de dopamina”.

O papel da dopamina:

A dopamina, um neurotransmissor relacionado ao prazer e motivação, é liberada durante atividades prazerosas, elevando o “ponto de ajuste hedônico”. A exposição crônica a estímulos de prazer pode levar à adaptação cerebral, exigindo mais estímulos para atingir o mesmo nível de satisfação.

O que seria jejum de dopamina?

O jejum de dopamina é uma técnica proposta para reconfigurar o circuito de recompensa do cérebro e reduzir comportamentos viciantes como o uso excessivo de mídias sociais, videogames, jogos de azar, entre outros.

Este termo, criado pelo psiquiatra californiano Dr. Cameron Sepah, tem muito pouco a ver exatamente com “privação” fisiológica de “dopamina”. A dopamina é apenas um mecanismo que explica como os vícios podem ser reforçados, mas não deve ser interpretado literalmente.

Como isso se aplicaria a mim ou ao meu paciente?

O recomendado seria um “jejum” de quatro semanas do hábito a que se quer mudar. Durante esse período, os pacientes experimentam uma redução no desejo e melhorias em humor, ansiedade e sono. O jejum não é uma abstenção total de prazeres, mas uma intervenção direcionada para mudar hábitos a longo prazo.

Sepah recomenda que comecemos um jejum de uma forma que seja minimamente perturbadora para o nosso estilo de vida . Por exemplo, poderíamos praticar o jejum de dopamina de uma a quatro horas no final do dia (dependendo das demandas do trabalho e da família), durante um dia de fim de semana inteiro, uma semana, ou mesmo durante uma viagem.

Tudo isso parece sensato, embora não necessariamente novo ou inovador. Na verdade, se parece muito com práticas de atenção plena e boa higiene do sono, por exemplo, quando sugere-se evitar telas ou determinadas atividades antes de dormir.

Mas, atenção!

Embora a dopamina aumente em resposta a recompensas ou atividades prazerosas, na verdade ela não diminui quando você evita atividades superestimulantes. Portanto, não se trata de reduzir verdadeiramente seus níveis de dopamina.

Algumas Críticas:
  • Muito simplista: Alguns especialistas argumentam que a ideia de um estoque finito de dopamina é imprecisa e preferem um “redirecionamento de dopamina” gradual para atividades saudáveis.
  • Falta de Boas Evidências Clínicas: A abordagem carece de respaldo em ensaios clínicos, levantando preocupações sobre sua eficácia.
  • Não serve para todos: A experiência de interromper o uso de uma substância ou hábito varia entre indivíduos. Fatores como motivação pessoal e capacidade de lidar com estressores são cruciais.
Conclusão:

Esta “desintoxicação de dopamina” não tem evidência científica para apoiar a sua eficácia até o momento.

Por outro lado, este tópico acende a discussão para a moderação do consumo e dependência. É importante considerar a individualidade de cada caso e a necessidade de estratégias personalizadas para lidar com esses hábitos que atrapalham nossos pacientes, ou nós próprios.

Referências

Fei YY, et al. (2022). Maladaptive or misunderstood? Dopamine fasting as a potential intervention for behavioral addiction. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/lim2.54

Klein MO, et al. (2019). Dopamine: Functions, signaling, and association with neurological diseases.
https://doi.org/10.1007/s10571-018-0632-3

Arias-Carrion O, et al. (2010). Dopaminergic reward system: A short integrative review.
https://link.springer.com/article/10.1007/s10571-018-0632-3
Franco R, et al. (2021). Dopamine in health and disease: Much more than a neurotransmitter.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7911410/

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Sobre o autor

Humberto Graner

Co-Editor do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Medicina Intensiva
Professor das Faculdades de Medicina da UFG e UniEvangélica (Goiás)
Doutor em Ciências pelo InCor-HCFMUSP
Fellowship em Coronariopatias Agudas pelo InCor-HCFMUSP
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein - Unidade Goiânia (GO)
Pesquisador da ARO (Academic Research Organization) - Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo (SP)

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