Miscelânia

Plásticos podem ser os novos vilões da saúde cardiovascular?

Escrito por Humberto Graner

Esta publicação também está disponível em: Português

Existem evidências crescentes que sugerem um possível impacto negativo dos plásticos na saúde. Partículas microplásticas foram encontradas em diversos tecidos humanos, sugerindo que uma exposição generalizada poderia estar associada a efeitos adversos na saúde. Os seres humanos são expostos a microplásticos e nanoplásticos por meio de ingestão e inalação, mas, até agora, as informações sobre os efeitos na saúde cardiovascular têm sido escassas.

Um novo estudo determinou  a presença e o prognóstico de microplásticos e nanoplasticos (MNPs) em placas carotídeas de 257 pacientes submetidos a endarterectomias carotídeas.

Eles conduziram um estudo observacional, prospectivo e multicêntrico, envolvendo pacientes que estavam se submetendo a endarterectomia carotídea por doença das carótidas assintomática. As amostras de placas carotídeas excisadas foram analisadas para a presença de MNPs com o uso de pirólise-cromatografia gasosa-espectrometria de massa, análise de isótopos estáveis e microscopia eletrônica. Biomarcadores inflamatórios também foram avaliados.

O desfecho primário foi um composto de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral ou morte por qualquer causa entre pacientes que tinham evidência de MNPs na placa em comparação com pacientes cuja placa não mostrava evidência de MNPs.

Polietileno estava presente em 58,4% dos pacientes, e cloreto de polivinila estava presente em 12,1% das placas dos pacientes. Esses pacientes foram acompanhados por uma média de 33,7 ± 6,9 meses.

Pacientes com partículas plásticas nas carótidas tiveram um risco aumentado de 4,53 vezes do desfecho primário. Os limites de confiança de 95% indicaram que o risco era entre duas vezes e dez vezes maior se partículas plásticas estivessem presentes.

O estudo conclui que pacientes com placas nas carótidas nas quais MNPs foram detectados tiveram um risco maior de um composto de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral ou morte por qualquer causa aos 34 meses de acompanhamento do que aqueles nos quais MNPs não foram detectados.

Tais achados são interessantes, foram publicados na revista mais prestigiada, mas possuem muitas limitações. Os resultados indicam uma associação entre a presença de micro e nanoplásticos em placas arteriais e o aumento do risco de doenças cardiovasculares ou morte, mas isso não prova causalidade. Há variáveis não medidas que podem ter influenciado, como exposições desconhecidas ao longo da vida do paciente, seu estado de saúde geral e comportamentos. Não foram consideradas a exposição a partículas finas PM2,5 e PM10, reconhecidas como fatores emergentes de risco para doenças cardiovasculares, e que podem estar associadas também a maior exposição à poluição por plásticos. Há ainda a possibilidade de contaminação no laboratório, apesar das medidas preventivas na coleta e análise das amostras terem sido descritas pelos autores. Estudos futuros em ambientes controlados (clean rooms) e sem plásticos poderiam reavaliar essas observações. Além disso,  dados socioeconômicos da população estudada não foram consideradas. Essa é uma informação importantes, pois renda e educação influenciam uma ampla gama de desfechos adversos, assim como maior exposição a plásticos e derivados. Também não foram exploradas a relação dos MNPs com alimentos e água potável, que podem contribuir para o acúmulo destas partículas em humanos. Os autores até buscaram fazer os ajustes para outros fatores de risco para doença cardiovasculares, mas chama a atenção que o impacto do LDL colesterol, pressão arterial (velhos conhecidos da saúde cardiovascular), foram muito menores do que a simples presença das partículas de plástico nas carótidas.

Logo, esses resultados são mais geradores de hipóteses do que uma prova de que a presença de minúsculas partículas de plástico são um novo fator de risco cardiovascular. Na ciência, é importante que resultados inesperados sejam replicados em outros trabalhos. Aguardemos os novos artigos que serão publicados sobre o assunto. 
Referência

Marfella R, Prattichizzo F, Sardu C, et al . Microplastics and Nanoplastics in Atheromas and Cardiovascular Events. N Engl J Med. 2024 Mar 7;390(10):900-910. doi: 10.1056/NEJMoa2309822.

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Sobre o autor

Humberto Graner

Co-Editor do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Medicina Intensiva
Professor das Faculdades de Medicina da UFG e UniEvangélica (Goiás)
Doutor em Ciências pelo InCor-HCFMUSP
Fellowship em Coronariopatias Agudas pelo InCor-HCFMUSP
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein - Unidade Goiânia (GO)
Pesquisador da ARO (Academic Research Organization) - Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo (SP)

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