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Qual o Risco Cardiovascular associado ao uso prolongado de medicamentos para TDAH?

Escrito por Humberto Graner

Esta publicação também está disponível em: Português

Um novo estudo sugere que o uso prolongado de medicamentos para tratar o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) está associado a um pequeno, mas estatisticamente significativo, aumento no risco cardiovascular.

O uso de medicamentos para tratar o TDAH tem aumentado acentuadamente nas últimas décadas, tanto em crianças quanto adultos. O risco potencial de doenças cardiovasculares associado ao uso prolongado destes medicamentos ainda é incerto. Isso porque a maioria dos estudos longitudinais que analisaram essa associação tiveram um tempo de seguimento curto, geralmente menor do que 2 anos. Por outro lado, este novo estudo sueco pôde acompanhar por até 14 anos crianças e adultos que utilizavam medicamentos para TDAH, e ainda analisou se as associações diferem entre tipos de medicamentos, dosagens, sexo, idade, e tipos de doença cardiovascular.

Metodologia e Resultados do Estudo

O estudo analisou 278.027 indivíduos entre 6 e 64 anos (mediana de idade 34,6 anos; 59,2% homens), diagnosticados com TDAH ou que utilizaram medicamentos para TDAH, dos quais 10.388 desenvolveram DCV. Eles foram pareados com outros 51.672 indivíduos controle.

Durante um período de acompanhamento mediano de 4,1 anos (máximo 14 anos), foi observado aumento do risco cardiovascular, sobretudo por maior incidência de hipertensão e doença arterial, mas não de arritmias, insuficiência cardíaca, doença isquêmica do coração, ou ou doença cerebrovascular.

A duração cumulativa mais longa do uso de medicamentos para TDAH foi associada a um risco aumentado de DCV em comparação com o não uso

  • 0 a ≤1 ano: OR ajustada 0,99 [IC95% 0,93-1,06);
  • 1 a ≤2 anos: OR ajustada 1,09 (IC95% 0,93-1,06);
  • 1 a ≤2 anos: OR ajustada 1,09 (IC95% 1,01-1,18);
  • 2 a ≤3 anos: OR ajustada 1,15 (IC95% 1,05-1,25);
  • 3 a ≤5 anos: OR ajustada 1,27 (IC95% 1,17-1,39);
  • e >5 anos: OR ajustada 1,23 (IC95% 1,12-1,36).

Especificamente para hipertensão, a razão de chances ajustada (OR) foi de 1,72 para 3 a ≤5 anos de uso de medicamento, e 1,80 para mais de 5 anos. Para doença arterial, o OR foi de 1,65 para 3 a ≤5 anos e 1,49 para mais de 5 anos.

Riscos Específicos dos Medicamentos Estimulantes

A pesquisa indicou que cada ano adicional de uso de medicamentos para TDAH estava associado a um aumento médio de 4% no risco de DCV, com um risco maior de 8% nos primeiros 3 anos de uso. Riscos semelhantes foram observados em crianças e adultos, assim como em mulheres e homens.

Ao focar em medicamentos específicos para TDAH, em comparação com o não uso, o uso prolongado do estimulante metilfenidato foi associado a um risco aumentado de DCV

  • por 3 a ≤ 5 anos: OR ajustada 1,20 (IC95% 1,10-1,31) e
  • por > 5 anos: OR ajustada 1,19 (IC95% 1,08-1,31).

O mesmo aconteceu com o uso prolongado do estimulante lisdexanfetamina

  • por 2 a ≤ 3 anos: OR ajustada 1,23 (IC 95% 1,05-1,44),
  • por > 3 anos: OR ajustada 1,17 (IC95% 0,98-1,40).

Em contraste, o uso do não estimulante atomoxetina foi associado ao risco elevado de DCV apenas no primeiro ano de uso.

O risco aumentado de DCV ocorreu apenas acima de certas doses diárias médias: 45 mg para metilfenidato e lisdexanfetamina, 22,5 mg para anfetaminas e 120 mg para atomoxetina.

Considerações e Recomendações

Os autores do estudo destacam que, apesar de ajustarem para uma ampla gama de variáveis de confusão, não puderam provar causalidade devido à natureza observacional do estudo. Nunca é demais reforçar que as decisões clínicas devem ser baseadas em avaliações cuidadosas de risco-benefício, levando em conta as condições individuais dos pacientes. Afinal, vários estudos de mundo real já mostraram que indivíduos com TDAH apresentam significativamente menos lesões físicas não-intencionais, menos acidentes de veículos motores, menor incidência de transtornos por abuso de substâncias, bem como melhor funcionamento acadêmico quando estão tomando essas medicações, comparados aos períodos em que não estão tomando.

O risco aumentado de hipertensão arterial associado ao uso prolongado de medicamentos para TDAH  não pode ser desconsiderado. Por outro lado, a relação risco-benefício pode ser menor em pessoas com doenças cardíacas pré-existentes. No entanto, são necessárias mais evidências para melhor orientar o tratamento de pacientes com TDAH e doenças cardiovasculares preexistentes.

Referência

Zhang LLi LAndell P, et al. Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder Medications and Long-Term Risk of Cardiovascular Diseases. JAMA Psychiatry. Published online November 22, 2023. doi:10.1001/jamapsychiatry.2023.4294

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Sobre o autor

Humberto Graner

Co-Editor do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Medicina Intensiva
Professor das Faculdades de Medicina da UFG e UniEvangélica (Goiás)
Doutor em Ciências pelo InCor-HCFMUSP
Fellowship em Coronariopatias Agudas pelo InCor-HCFMUSP
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein - Unidade Goiânia (GO)
Pesquisador da ARO (Academic Research Organization) - Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo (SP)

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