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Novas evidências sobre suplementação de Vitamina D: o que mudou?

Escrito por Humberto Graner

Esta publicação também está disponível em: Português

A vitamina D é um nutriente essencial que desempenha vários papéis importantes no corpo, incluindo a manutenção da saúde óssea e do sistema imunológico. Ela também tem sido associada à saúde cardiovascular de várias maneiras. Estudos sugerem que a vitamina D pode influenciar no controle da pressão arterial, reduzi a inflamação e melhora a função endotelial. No entanto, as evidências sobre o benefício da vitamina D para doenças cardiovasculares são mistas. Alguns estudos sugerem que níveis mais baixos de vitamina D no sangue estão associados a um maior risco de doenças cardiovasculares, mas outros ensaios clínicos não mostraram benefícios quando a vitamina D foi suplementada.

Sem uma resposta definitiva, novos estudos continuam a testar esse conceito. Um novo estudo publicado buscou avaliar se a suplementação com vitamina D em doses mensais em idosos influencia a incidência de eventos cardiovasculares significativos.

O D-Health Trial foi um ensaio clínico randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, que testou a administração mensal de vitamina D numa população específica. O estudo foi realizado na Austrália, entre 2014 e 2020. Foram incluídos 21.315 pessoas, entre 60 e 84 anos. Indivíduos com história de hipercalcemia, hiperparatireoidismo, nefrolitíase, osteomalácia, sarcoidose, ingestão de mais de 500 UI/dia de vitamina D suplementar eram excluídos do estudo.

Os participantes receberam 60.000 UI/mês de vitamina D3 (n=10.662) ou placebo (n=10.653), via oral, por até cinco anos. Ao final do período de intervenção, 16.882 participantes completaram o estudo: placebo 8270 (77,6%); vitamina D 8552 (80,2%).

O desfecho primário foi a ocorrência de um evento cardiovascular maior, incluindo infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral e revascularização coronária

Após uma mediana de cinco anos, 1336 participantes sofreram um evento cardiovascular (placebo = 699 (6,6%); vitamina D = 637 (6,0%)). A taxa de eventos cardiovasculares foi menor no grupo da vitamina D do que no grupo do placebo (HR 0,91, IC95% 0,81 a 1,01). A diferença na incidência cumulativa específica padronizada em cinco anos foi de -5,8 eventos por 1000 participantes (IC95% -12,2 a 0,5 por 1000 participantes), o que resulta em um número necessário para tratar de 172 para evitar um evento cardiovascular importante. A taxa de infarto do miocárdio (HR 0,81, IC95% 0,67 a 0,98) foi menor no grupo da vitamina D, mas não houve diferença na taxa de revascularização coronária (HR 0,89, IC95% 0,78 a 1,01) e acidente vascular cerebral (HR 0,99, IC95% 0,80 a 1,23).

Os autores concluem que “A suplementação com vitamina D pode reduzir a incidência de eventos cardiovasculares significativos, ainda que a diferença absoluta de risco seja pequena e o intervalo de confiança esteja de acordo com uma conclusão nula.

Percebeu algo de errado na conclusão? Não?

O estudo foi desenhado para um desfecho composto de eventos cardiovasculares. Na análise geral do estudo para este desfecho, o resultado foi NULO. Simples assim! O intervalo de confiança inclui a unidade (1)! Ou seja, como um afirmar que “pode reduzir a incidência de eventos” se a “conclusão é nula”?

O que muda?

Na prática, não muda nada. Mesmo focando em pacientes mais idosos, na tentativa de verificar possível benefício, este estudo segue o que outros já encontraram.

Reveja:

Ou seja, apesar de uma associação entre níveis baixos de vitamina D e morbidade cardiovascular, a suplementação de vitamina D, até o momento, não demonstrou reduzir o risco de doenças cardiovasculares.

Por que é tão difícil estudar este tópico sobre vitamina D e saúde cardiovascular?

A relação entre vitamina D e saúde é complexa e pode ser afetada por uma variedade de fatores. A vitamina D é produzida pela pele em resposta à exposição ao sol, por isso, fatores como localização geográfica, estação do ano, tempo passado ao ar livre e uso de protetor solar podem influenciar os níveis de vitamina D. Além disso, a vitamina D é lipossolúvel e pode ser armazenada no tecido adiposo, o que pode influenciar a disponibilidade de vitamina D no organismo. Por fim, o efeito da vitamina D no corpo pode ser influenciado por fatores genéticos que afetam a maneira como a vitamina D é metabolizada e utilizada pelo organismo. Além disso, níveis séricos mais baixos de vitamina D pode representar mais uma consequência da inflamação vascular crônica, e, portanto, aumentar sua biodisponibilidade orgânica não parece influenciar os desfechos secundários de disfunção endotelial e aterosclerose.

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Referência:

Thompson B, Waterhouse M, English DR, et al. Vitamin D supplementation and major cardiovascular events: D-Health randomised controlled trial. BMJ. 2023 Jun 28;381:e075230. doi: 10.1136/bmj-2023-075230. 

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Sobre o autor

Humberto Graner

Co-Editor do site Cardiopapers
Especialista em Cardiologia e Medicina Intensiva
Professor das Faculdades de Medicina da UFG e UniEvangélica (Goiás)
Doutor em Ciências pelo InCor-HCFMUSP
Fellowship em Coronariopatias Agudas pelo InCor-HCFMUSP
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein - Unidade Goiânia (GO)
Pesquisador da ARO (Academic Research Organization) - Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo (SP)

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