Miscelânia

Pré-eclâmpsia e aterosclerose: avaliando o risco cardiovascular futuro

Escrito por Alexandre Lucena

Esta publicação também está disponível em: Português

A pré-eclâmpsia (PE) é um marcador de risco cardiovascular futuro estabelecido, classificado como fator de risco emergente.  Há um aumento de risco estimado para hipertensão arterial em 4 vezes e para doença arterial coronária de 2 vezes em mulheres que tiveram PE prévia. Mas haveria associação independente entre pré-eclâmpsia e aterosclerose?

Em 14 de junho de 2022 foi publicado no JACC o estudo Early Coronary Atherosclerosis in Women With Previous Preeclampsia (CPH-PRECIOUS) conduzido por um grupo de Copenhague. Este estudo teve por objetivo determinar a prevalência de doença aterosclerótica coronariana (DAC) em mulheres na faixa etária entre 40 e 55 anos que tiveram pré-eclâmpsia prévia comparado com mulheres de mesma faixa etária que não tiveram pré-eclâmpsia.

Para avaliar a presença de DAC foram utilizados o escore de cálcio 0 ou qualquer doença aterosclerótica identificada na angiotomografia de coronárias. As 1.417 mulheres pesquisadas foram divididas em dois grupos, o grupo com PE prévia (708 mulheres) e o grupo controle (709 mulheres).

Qual resultado?

A presença de aterosclerose no grupo de mulheres com PE foi maior (27,4% x 20%, p = 0,001 / OR 1,41) mesmo quando ajustado por idade, diabetes, dislipidemia, tabagismo, IMC, menopausa e paridade.

Pontos importantes do estudo:

  • A PE foi classificada como fator de risco independente para doença aterosclerótica coronariana após o ajuste com os fatores de risco tradicionais.
  • Analisando por subgrupos de fatores de risco vemos que as pacientes do grupo com PE prévia tinham mais hipertensão arterial (40,1% x 22,8%), mais dislipidemia (47,7% x 41,7%), mais DM (3,4% x 1,1%), e IMC maior (27,3 x 25), todos com P significante.
  • A estimativa de risco para 10 anos na calculadora ASCVD foi baixa para os dois grupos.
  • Como era esperado antes do estudo a prevalência de DAC entre 5 e 10% nos grupos, a prevalência maior (aproximadamente 18%) surpreendeu os pesquisadores.
  • No grupo de mulheres com PE prévia houve maior prevalência de mulheres já em menopausa, um possível viés, uma vez que menopausa precoce é marcador de risco para DAC já estabelecido.
  • Aproximadamente 40% das mulheres que tinham aterosclerose tinham placas não calcificadas. Esse fato pode ser relevante na estratificação não invasiva de mulheres, principalmente nas de risco intermediário, dando-se preferência à angiotomografia de coronárias em detrimento do escore de cálcio. Entretanto, o estudo não teve o desenho para isso e não define a questão.
  • A população estudada é uma população europeia de alto nível educacional, fato que diminui o poder de generalização para nosso país.
  • Foram incluídas pacientes com “PE leve/moderada”, “PE grave”, PE indeterminada, Eclampsia, e síndrome HELLP. Dentre esses subgrupos, o que teve maior associação com doença aterosclerótica foi a de “PE grave” (não se usa mais esses termos de PE leve, moderada ou grave – o estudo pesquisou gestações a partir de 1995 quando ainda se usavam esses termos).

O estudo CPH-PRECIOUS não avaliou desfechos clínicos, apenas a presença de doença aterosclerótica nas mulheres em determinada faixa etária, então é necessário correlacionar posteriormente esses dados com outros que mostrem eventos clínicos, como mortalidade cardiovascular, e o impacto de detectar precocemente e iniciar o tratamento também precoce, como por exemplo estatinas e mudanças de estilo de vida.

Lição:

O fato é que fica cada vez mais claro que a pesquisa dos antecedentes obstétricos durante a consulta clínica deve ser parte integrante da anamnese, e o seguimento de mulheres com malpassado obstétrico, com diabetes gestacional e hipertensão na gravidez (principalmente PE) deve ser visto de outra forma. Dessa forma, a associação entre pré-eclâmpsia e aterosclerose não pode ser esquecida.

(Quer saber mais sobre pré-eclâmpsia e aterosclerose? Confira este nosso post: https://d3gjbiomfzjjxw.cloudfront.net/hipertensao-gestacional-aumento-o-risco-de-doenca-cardiovascular/)

REFERÊNCIA

Hauge MG, Damm P, Kofoed KF, Ersbøll AS, Johansen M, Sigvardsen PE, Møller MB, Fuchs A, Kühl JT, Nordestgaard BG, Køber LV, Gustafsson F, Linde JJ. Early Coronary Atherosclerosis in Women With Previous Preeclampsia. J Am Coll Cardiol. 2022 Jun 14;79(23):2310-2321. (https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0735109722047507?via%3Dihub)

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Alexandre Lucena

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